Dupla Identidade
Série global, Dupla Identidade vem se mostrando uma das melhores histórias já exibidas pela televisão brasileira; clima sombrio ajuda
Por Luis Fernando Pereira
Desde o momento de sua estreia, lá em meados de setembro, que Dupla Identidade vem conquistando o público brasileiro com uma história nada comum aos nossos padrões: contar a saga de um serial killer. As referências são percebidas, e podemos citar Dexter, The Killing, The Fall, CSI… a série bebe de todas estas fontes americanas e inglesas, não há como negar, e não há porque se envergonhar, afinal de contas o tema central da história é bem instigante e não pode ser de propriedade de um único país. Foram dez episódios até aqui e muita coisa interessante aconteceu, na trama e na parte técnica. Vamos ver um resumo de tudo isso agora.
Fotografia
Logo no episódio de estreia percebemos que a fotografia seria o principal elemento técnico da história, por apresentar uma Rio de Janeiro menos colorida e mais sombria, implementando desde os segundos iniciais a atmosfera que a série desejava passar. Não chega a ser um submundo, mas simplesmente uma perspectiva mais carregada da cidade, que ainda assim mostra a sua beleza. É interessante observar o quão a Rede Globo deseja deixar Dupla Identidade com ares universais, facilitando assim a sua venda para diversos países.
Cenografia
O trabalho de cenografia e direção de arte vem, desde o início, romantizando os trabalhos, tanto da polícia, quanto da perícia técnica. Pela visão da série, nossos policiais e peritos são bem parecidos com os americanos do CSI, o que cá entre nós é uma tremenda mentira. Ainda assim, não há mal algum em – por questões plásticas – transformar a bagunça que deve ser o IML do Rio de Janeiro em um local até mesmo aprazível.
Roteiro
O maior problema que detectamos na estreia foi o didatismo que vimos nas primeiras cenas entre os personagens de Luana Piovani e Marcelo Novaes. Durante alguns episódios esse problema continuou, pois sabíamos que Vera não tinha ninguém que pudesse dialogar com ela de igual pra igual na equipe policial, então só restava ao roteiro tratá-la como uma professora do tema assassinatos em série. O problema é que esse didatismo era exagerado e subestimava a capacidade do espectador em querer entender por conta própria a trama. Por sorte, este problema foi 90% resolvido.
Dupla Identidade
Bruno Gagliasso
Quem sai da série fortalecido é o ator Bruno Gagliasso. Ele mostrou que é capaz de interpretar um personagem com camadas, que apresenta múltiplas personalidades, bem dignas de um psicopata. Com o passar dos episódios fomos observando elementos de outros assassinos, e era como se seu personagem (Edu) fosse um estudiosos da profissão e buscasse se utilizar das melhores influências para construir sua psicopatia. Bruno vem carregando a trama com muita competência e durante os primeiros cinco episódios foi o único destaque da história. Somente depois que passou a dividir com outros os louros da série.
Marcelo Novaes e Luana Piovani
Os personagens de Marcelo Novaes e Luana Piovani mostraram, desde o início, uma falta de personalidade, pois todas as sequências deles soavam bastante genéricas. Vera, que lembra um pouco a personagem de Gillian Anderson em The Fall, precisava sair logo do didatismo e das frases de efeito. A medida que fomos sabendo de sua história, de seu caso de amor com Dias, de sua decepção com ele, de sua escolha em se especializar na profissão fora do país… tudo isso fez sua personagem ganhar mais empatia com o público e hoje ela já consegue ser uma peça importante para Dupla Identidade.
Débora Falabella
Débora Falabella, que no início apresentou bem superficialmente sua personagem, cresceu absurdamente com o passar dos capítulos e em um deles específico sua personagem Ray entregou à série uma personagem com a capacidade de se nivelar ao seu protagonista, Edu. Ray mostrou que possui uma personalidade tão poderosa quanto à de Edu. Suas crises de raiva, que culminou em uma das cenas mais bem produzidas da série até aqui (a destruição do carro de Edu), foi a prova definitiva do quão intenso é a vida de alguém que sofre do transtorno de borderline. Esta cena da destruição do carro foi consequência do ataque de fúria dela ao ser esquecida novamente por Edu. Perceba o quão extremo pode ser o humor de alguém que sofre de borderline. Em uma noite ela vivia seu momento mais feliz, sendo pedida em noivado e no dia seguinte ela estava em transe psicótico.
A história
A trama de Dupla Identidade cresceu muito do piloto até aqui. No início Ray era uma personagem secundária, o núcleo político tinha bastante destaque, Vera e Dias viviam compartilhando um segredo com o espectador e Edu matava suas vítimas tranquilamente. Com o tempo, suas mortes foram ficando cada vez mais artísticas, culminado com o caso envolvendo Ana, interpretada brilhantemente por Bárbara Paz. Já Ray foi ganhando cada vez mais espaço para mostrar como a sua doença interfere na sua relação com Edu. Ray e Edu formam um dupla bem interessante e o desfecho deste caso é um dos mais esperados da série.
Dupla Identidade
Vera e Dias cresceram, não há como negar. Vera passou a ser mais respeitada e chegou até a tomar a frente em algumas situações (como no caso de Ana e depois ao ir visitar Edu em sua casa). Dias ganhou destaque quando sua mulher e sua filha apareceram na história. A partir de então percebemos como Vera é a sua grande paixão. Muito provável que os dois terminem juntos.
A parte política, com o Senador, sua esposa e filho perderam espaço, mas promete ter um desfecho interessante, primeiro porque Marisa Orth (e sua personagem) resolveu trabalhar um pouco. Seu envolvimento com Edu foi fundamental para isso e não sabemos se ela o vê como uma mãe querendo o bem do filho ou como uma mulher, seduzida por um galã.
Dupla Identidade chega ao final de sua temporada com muitas questões: será que Edu ainda irá matar? De quem era a cabeça vista no freezer em um dos últimos episódios? Vera e Dias terminarão juntos? Edu fará de Tati, a filha de Dias, mais uma de suas vítimas? Que desfecho terá Ray? Pode o cadarço de um tenis usado em um dos crimes inocentar Edu?
Que venham os próximos episódios.
Luis Fernando Pereira é crítico cultural e editor/administrador do site