Literatura

A Revista Bravo e o seu fim

Revista Bravo

Enquanto, no Brasil, o otimismo panfletado pelo governo petista ainda paira no céu de algumas empresas, a crise financeira e mais alguns tropeços de administração podem arrastar algumas empresas à bancarrota. A Business Insider fez uma lista de 17 companhias que correm o risco de pedir falência este ano. Em maio último, o jornal “Financial Times”, em editorial de 19/05 (“Go-go to go-slow”), “rides again” fez um texto apocalíptico contra o Brasil e contra o governo Dilma. Interessante o modo como esse jornal britânico constrói a retórica contra o governo Dilma: primeiro, fala-se de tudo o que Brasil conquistou recentemente; depois, garante, tudo isto não passa de uma “fachada”; daí vem o discurso da miséria, como se só eles soubessem: na verdade, este bem-estar aparente esconde um mal-estar. Mas acho que o tal jornalista tem razão!

E depois dos editores da revista “Playboy” terem divulgado o fim das edições brasileiras, a consumida e cultuada desde 1953 por ser uma revista de nudez “artística moderada”, moralista e intelectual, a “Playboy” estava prestes a ser descontinuada pelos irmãos Civita da Editora Abril. Mas, ironicamente, entretanto, depois de vários pedidos de fãs pela internet, a glamourosa publicação está prestes a ser “salva” (*nem sei se o termo é esse!) por sua prima de classe média da Editora Rickdan. Estamos falando da péssima revista “Sexy”. Muito menos discreta do que a sua prima rica, a “Sexy” é tradicionalmente conhecida por ter menos entrevistas reveladoras e por expor as modelos em poses ginecológicas, o que atrai um público diferenciado e totalmente desqualificado.

Revista Bravo

Contudo, a Abril Mídia divulgou na semana passada, oficialmente, o fim de outro produto da casa, a excelente revista “BRAVO!”. A publicação – uma das únicas no País dedicada exclusivamente às artes, onde já publiquei umas crônicas desaforadas entre 2005 e 2008 – nasceu em outubro de 1997. Estava, portanto, à beira de completar 16 anos. Foi criada numa pequena editora de São Paulo, a D’Ávila, já extinta, e migrou para o grupo Abril em janeiro de 2004. Quando chegou à seara dos Civita, desfrutava de prestígio, mas padecia de má saúde financeira – como tantas outras. Parece que já foi confirmando os rumores de mais alguns títulos que poderiam ser descontinuados, especulação que circulava no mercado desde o início da semana, onde o Grupo Abril acaba de emitir um comunicado oficial para falar de decisões importantes dentro de seu processo de reorganização iniciado pelo presidente Fábio Colletti Barbosaconfira aqui.

Mas com todos os defeitos que essas edições de revistas brasileiras possam ter – e que realmente tem, à semelhança de qualquer publicação –, “BRAVO!”, por exemplo, é uma das poucas que não perdeu o respeito do meio cultural. Havia divergências de vários artistas e intelectuais em relação à revista, muitos jornalistas que passaram pela redação nem sempre concordavam 100% com a filosofia do título, ditada obviamente pelos donos. Uns poucos outros, sobretudo no meio acadêmico, o acusavam de conservador, outros de elitista, superficial ou condescendente demais. Mas havia também muita gente boa que gostava de escrever e comprar as edições.

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O fato é que mesmo os opositores jamais recusaram sair nas páginas de “BRAVO!”. Quem trabalhava para a publicação raramente ouvia um “não” quando fazia pedidos de entrevista. Até Chico Buarque, famoso por se expor pouquíssimo na mídia, topou protagonizar uma capa junto de Caetano Veloso (deixou-se fotografar, mas não abriu a boca, convém lembrar). Todos, de um modo geral, reconheciam que a publicação buscava primar pela seriedade. Mesmo assim, segundo fontes, em termos comerciais, “BRAVO!” nunca gerou lucro – pelo menos, não na Abril. A revista, embora contasse com o apoio da Lei Rouanet, operava no vermelho. Em bom português, dava prejuízo – ora de milhões, ora de milhares de reais. Por quê?

Talvez a soma de vários fatores, além dessa política assistencialista desse governo medíocre do PT, tenha tornado a “BRAVO!” deficitária. Ao longo dos anos, tentaram-se diversas medidas para estancar o sangramento. O número de páginas da revista diminuiu de 114 para 98; as datas em que a publicação rodava na gráfica da Abril se alteraram algumas vezes com o intuito de reduzir os custos de impressão; os projetos gráfico e editorial sofreram ajustes; criaram-se ações de marketing pontuais na esperança de aumentar a receita publicitária. Cogitou-se, inclusive, mudar o papel e o formato de “BRAVO!”. O Publisher Roberto Civita (1936-2013), porém, sempre vetou a alteração. Acreditava que fazê-la descaracterizaria em excesso a revista. Mas parece que a crise está instalada na imprensa de todo o mundo. Gregos e troianos dizem que a mídia tradicional precisa se reinventar. Eu também digo. Mas qual o caminho das pedras? Não sei. No máximo, posso arriscar uns palpites. E seguir investigando, e seguir apostando. O mesmo vale para os empresários da comunicação. Gostaria imensamente que a edição de agosto não fosse a última de “BRAVO!”. Entristeço-me com o fim de mais uma publicação para incentivava à cultura porque aprecio muitíssimo a arte. Filmes, livros, peças, músicas, instalações, pinturas, balés e quadrinhos me ensinaram mais sobre viver do que a própria vivência.

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No entanto, não bancarei o viúvo rancoroso. Não lamentarei a baixa escolaridade do brasileiro, o pragmatismo dos publicitários, a falta de visão e total ignorâncias de muitos editores e dos patrões, o advento da revolução digital. Tampouco abdicarei de minhas responsabilidades frente aos erros e acertos da revista. Fiz e ainda faço parte do complexo jogo em que a mídia se insere. Procuro encará-lo com amor, senso crítico e serenidade. Nem sempre consigo, mas…

Elenilson Nascimento – dentre outras coisas – é escritor, colaborador do Cabine Cultural e possui o excelente blog Literatura Clandestina.

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