Kick-Ass 2
Filme que, estranhamente, se salva por conta do personagem que acreditávamos que seria engolido pelo poder de Hit Girl
A expectativa criada mundo afora ao saber que Kick-Ass teria uma sequência era bem grande. Ao mesmo tempo em que um sorriso se abria, uma preocupação crescia. O quão coerente seria esta continuação? Há um problema geral da indústria cinematográfica em não conseguir perceber que certos filmes (suas narrativas, suas mitologias) já deram o que tinha que dar e resolvem, por causa somente do dinheiro ou outra questão que seja a criativa, continuar às suas histórias e desenvolver demais ou ampliar a exaustão sua mitologia.
Matrix é o grande exemplo que podemos oferecer, pois seu primeiro filme é considerado uma das obras primas do cinema moderno e, no entanto, quando se pensa nele como parte de uma trilogia seu poder cai drasticamente, criando um sentimento de frustração tremenda, de não entender como deixaram transformar toda aquela história mítica em um apanhado de discursos frágeis e pseudo-filosóficos.
Mesmo assim uma ida aos cinemas para ver Kick-Ass 2 se fazia necessária, afinal de contas era uma oportunidade bacana para rever talentosa e querida Chloë Grace Moretz como a Mindy Macready, ou melhor, como a magnificente Hit-Girl. Ela definitivamente havia roubado a cena no primeiro filme e com isso era certo que a sequência iria explorar bem mais a sua personagem, tão mais rica e densa que a do próprio Kick-Ass.
E é neste instante de buscar explorar mais a personagem que o maior problema de Kick-Ass 2 vem à tona: colocaram a Hit Girl em todas as situações clichês pelas quais uma adolescente americana passa, e com isso a transformaram numa personagem infinitamente menos poderosa que sua versão passada, quando ainda lutava junto com seu pai.
Até há uma compreensão sobre esta escolha – natural – afinal tínhamos ali uma adolescente que havia acabado de perder o pai – seu único porto seguro – para o crime organizado; a partir de então sua custódia ficaria a cargo de um ‘pai’ normal, que certamente buscaria tirá-la daquele mundo em que ela era inserida e a faria vivenciar tudo que uma garota de sua idade vive.
O problema é que extrapolaram ao colocá-la como uma espécie de versão feminina de Clark Kent na extinta série Smallville. O roteiro momentaneamente deixou de lado a essência de Hit Girl e a fizeram até mesmo desejar entrar para o time de Cheerleaders, numa das cenas mais constrangedoras do filme, em que ela dança para as meninas imaginando estar ali lutando com os inimigos.
Mais pra frente criaram uma situação, também desnecessária, de traição envolvendo suas supostas amigas, reafirmando aquela ideia clichê de que toda adolescente americana é uma produtora de bullying em potencial. As cenas em que ela é levada por um garoto para a armadilha e depois o modo como ela resolve se vingar são definitivamente pontos fracos do filme.
Filme este que, estranhamente, se salva por conta do personagem que acreditávamos que seria engolido pelo poder de Hit Girl. Sim, Kick-Ass, seus dilemas pessoais e sua relação com o pai amenizaram um pouco os incômodos sentidos na história. Aaron Taylor-Johnson, que dá vida a Kick-Ass, realmente caiu como uma luva no personagem, trazendo todos os questionamentos e embates de um jovem nerd que quer ser um herói.
Todas as sequências dele com seus amigos da Liga da Justiça são bem feitas e funciona como comédia e também como drama. Mas só funciona por conta da existência de um bom anti-herói, The Mother Fucker, que mesmo com todos os problemas narrativos (a história dele com sua mãe é bem inconsistente, frágil e tola) ainda é a melhor parte do filme.