Confissões de adolescente tem estreia prevista para 10 de janeiro
O mérito de ambos, série e filme, está justamente aí. Com doçura, com humor, com umas pequenas ousadias aqui e ali, o importante é mesmo causar uma sensação de identificação no público
Numa época onde tudo é transmídia, “Confissões de Adolescente” passou na frente de todo mundo. Primeiro foi peça de teatro, depois virou livro com o texto do espetáculo publicado, depois uma série de TV, e agora finalmente chega aos cinemas. Com tantas referências de produtos lançados anteriormente, como lidar com um filme sobre conflitos da adolescência, vinte anos depois da série que virou referência no tema na televisão?
O longa, dirigido por Daniel Filho (que também dirigiu a série, veiculada pela Cultura nos anos 1990), tem sua base nas mesmas premissas do seriado: quatro irmãs órfãs de mãe passam pelos desajustes da adolescência ao lado do pai solteiro. No filme, as mocinhas são Tina (Sophia Abrahão), Bianca (Bella Camero), Alice (Malu Rodrigues) e Karina (Clara Tiezzi), e o pai é interpretado por Cassio Gabus Mendes. A sinopse é simples: Paulo, o pai, avisa às filhas adolescentes que irão se mudar porque o aluguel aumentou absurdamente. Desesperadas com a possibilidade de deixar o bairro, as quatro moças decidem economizar sem precisar mudar radicalmente o seu estilo de vida.
O mote da narrativa de “Confissões de Adolescente” em todas as suas versões é simplesmente acompanhar o cotidiano de quatro adolescentes, com poucos anos de diferença entre si, focando em conflitos que atravessam essa geração. O filme, no entanto, está a todo o momento vacilando em uma armadilha que lhe parece inevitável, e que acontece com praticamente todos os filmes que são adaptações de séries – há uma confusão entre as estratégias narrativas usadas para a TV e para o cinema. Enquanto na série é possível desenvolver com calma e tranquilidade os conflitos de cada personagem, bem como sustentar conflitos paralelos de forma a dar conta de todo um universo de personagens, no filme é necessário focar em um gancho que norteia toda a narrativa e que, se possível, deixe claro o início, meio e o fim.
Confissões de Adolescente – Foto Divulgação
Provavelmente o único pecado de “Confissões”, o filme, é não lidar muito bem com essa mudança de natureza na narrativa. A sensação é que estamos assistindo a vários episódios que se misturam e não têm nem começo nem fim muito bem definidos, e acabam por dar a sensação de um roteiro fraco. Mas por incrível que pareça, isso em nenhum momento tira o prazer de assistir às desventuras das quatro meninas. Primeiro porque a linguagem moderna está presente tanto nas inúmeras alusões ao Facebook (que substituiu o diário da Diana, personagem da Maria Mariana, criadora da série) como na edição ágil, “digital”, “moderna”, cheia de cortes, sobreposições e efeitos. Tais artifícios geram um sentimento de identificação forte com a nova geração adolescente, público-alvo do longa, e é justamente por isso que ele funciona.
Por outro lado, o filme tem a seu favor a curiosidade da geração que foi adolescente nos anos 1990, que assistia a série toda semana na Cultura e que hoje está na faixa dos trinta anos. Provavelmente contando com essa audiência bem específica, “Confissões” transita de forma agradável entre as duas gerações.
Praticamente todo o elenco do filme é visto em Malhação (que pode ser considerada uma similar da série escrita por Maria Mariana), mas nada disso impede que o filme faça adoráveis referências à serie que lhe deu origem. Não só com a aparição “afetiva” das quatro atrizes do elenco do seriado (Maria Mariana, Georgina Góes, Daniele Valente e Deborah Secco), mas algumas situações e conflitos marcantes na primeira temporada, bem como diálogos e falas que remetem a cenas específicas da série, detalhes que só aqueles que acompanharam a série podem perceber.
Por essas razões, a experiência de assistir o filme “Confissões de Adolescente” em pleno 2014 soa ao mesmo tempo refrescante e nostálgico, o que é, de um modo ou de outro, super agradável. Se por um lado o filme traz de volta aqueles mesmos temas de sempre que permeiam a adolescência, não se esquiva do desafio de dialogar com a geração à qual pertence, mesmo consciente de que a referência ao histórico da série conta muito na sua apreciação.
Naturalmente cobranças são feitas no sentido de o filme poder ter abordado melhor determinados conflitos, etc, mas o fato é que “Confissões” é um longa que diz a que veio de forma muito tranquila, sem pretensões de revolucionar a linguagem voltada para o público teen – e é importante lembrar que a própria série não fez isso, apenas colocou os adolescentes e seu universo em foco. O mérito de ambos, série e filme, está justamente aí. Com doçura, com humor, com umas pequenas ousadias aqui e ali, o importante é mesmo causar uma sensação de identificação no público e dialogar com ele. Impossível negar que o filme consegue fazê-lo muito bem.
Ana Camila é jornalista cultural, assessora de comunicação, produtora cultural e mestre em Cinema pela Universidade Federal da Bahia.