Literatura

Entrevista Augusto Soledade

Brazz Dance Theater

Augusto Soledade é natural da Bahia, performer, coreógrafo e professor de dança da Nova Southeastern University. Ele fundou o Brazz Dance Theater, em Miami, em 1998 e desde então tem recebido inúmeros prêmios nos Estados Unidos, incluindo fundos do subsídio do Conselho de Artes Northampton e Smith College para desenvolver coreografias, bem como projetos de pesquisa. Este próximo fim de semana marcará mais um retorno seu à terra natal, Salvador, para participar do Vivadança 2013. Cordel, o espetáculo, é o mais novo trabalho da Brazz Dance, companhia que funde a dança afro-brasileira à dança contemporânea. O trabalho é composto por uma dança abstrata, inspirado nos contextos sociais nos quais surgiram o tango, na Argentina, e o hip hop, nos Estados Unidos, bem como a tradição da literatura de cordel no nordeste brasileiro. Nessa entrevista exclusiva ele nos fala do espetáculo, do festival e de seus trabalhos nos Estados Unidos ao longo destes anos. Confira.

Brazz Dance Theater

Fernando Pereira – Queria começar falando do espetáculo que a Brazz Dance  traz para esta edição do Vivadança. Cordel propõe um diálogo entre a dança e as questões sociais, com inspiração na literatura de cordel. Como foi que surgiu essa junção de elementos na criação do espetáculo?
Augusto Soledade – Na verdade as questões sociais serviram como elo entre o tango argentino, o hip-hop e literatura  de  cordel.  O  contexto  histórico  na  origem  do  tango  reflete  um  nível  de marginalidade que também está presente na origem do hip-hop e da literatura de Cordel. A marginalidade entra como pano de fundo para exploração de relações humanas que são então traduzidas em movimento e estrutura coreográfica.

FP – Isso é bem comum nos trabalhos da Cia. Lembro que em Dreaming Amazonia você propôs uma  reflexão através da dança sobre o desmatamento da Floresta Amazônica. Como surgem os temas no seu processo criativo?
AS – Pois é, tento buscar nessas temáticas atuais uma maneira de me manter corrente no que diz respeito a  abordagem artística e relevância do trabalho.

FP – O espetáculo acaba refletindo o espírito da Brazz Dance? Um projeto que é global, com influências de várias partes do mundo, mas ao mesmo tempo ligada com as raízes brasileiras.
AS – Exato. Na minha busca artistica descobri que a minha cultura de base baiana serve como uma lente que  amplia e filtra o meu entendimento de mundo. Mas a minha proposta artística nao é de representar de forma traditional essa cultura de base; eu ja viajei muito por esse mundo e também sempre encontrei  ligações profundas com outras culturas estrangeiras. Percebi então que quanto mais viajava mais  ciente do meu sentido de raízes eu tinha, mas tambem tornou-se óbvio a naturalidade em se  estabelecer novas relações com o desconhecido. É uma questao de manter a mente aberta.

FP  –  Isso  acontece  também  no  grupo  de  bailarinos,  onde  há  diversos  países representados.  Você  acha  que  essa  pluralidade  acaba  ajudando  na  concepção  dos espetáculos do grupo?
AS – Acho a pluralidade no corpo de bailarinos essencial para desenvolver o sentido amplo da abordagem artistica. Gosto de saber que os bailarinos apesar de não serem brasileiros conseguem ir do samba ao hip-hop passando pela dança contemporanea, ballet e vários outros estilos. O importante é a contribuição que a individualidade de cada um traz para a construção de um movimento rico em experiências.

FP – Vocês chegam ao Vivadança comemorando 15 anos de criação da companhia, que é relevante  artisticamente, respeitada e com notoriedade, aqui e nos Estados Unidos. Pensando um pouco no futuro, como você projeta a Brazz Dance para os próximos 15 anos? Existe algum projeto de expansão?
AS – Um dos meus maiores sonhos é estabelecer uma ponte entre a companhia e bailarinos do mundo  inteiro, mas especialmente da Bahia. Atualmente temos a bailarina baiana Leilane Teles, que inclusive  foi premiada em primeiro lugar no edital de Mobilidade Artistica da Secult BA, fazendo um estágio em Miami com a companhia. Devido as tensões globais, o acesso ao imigrante nos EUA tem sido bem complicado, por isso  acredito que esse é um projeto que vai levar um pouco de tempo para se estabelecer.

Brazz Dance Theater. Foto de Jade Matarazzo

FP – Você tem vivenciado mais o mercado americano de dança, mas imagino que também conheça o mercado brasileiro. As diferenças (financeiras e artísticas) ainda são grandes ou você considera o  mercado de dança no Brasil hoje tão bom quanto nos Estados Unidos?
AS – Na verdade não tenho mais tanta experiência com o mercado de dança brasileiro, já vivo nos EUA há 18 anos, e não tenho tido muito oportunidade de me apresentar aqui, e sei muitas coisas mudaram desde que sai. Mas percebo ainda uma dificuldade muito grande para o bailarino brasileiro de conseguir um emprego, principalmente em companhia de dança, que ofereça a sustentabilidade que todos  precisamos. Vejo de um modo geral muitos bailarinos ainda tendo de ensinar como fonte principal de renda. Nos Estados Unidos, mas mais em centros urbanos maiores, as secretarias de cultura oferecem editais que ajudam muito na produção de trabalhos, tambem culturalmente, o americano tem o habito de pagar  ingresso para assistir ao espetáculo como forma de apoio, e isso muitas vezes ajuda muito com o custo de produção.

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