Literatura

Literatura: O sucesso e a decadência de 15 artistas da Era do Rádio

Artistas da Era do Rádio

De Francisco Alves; passando por Cauby, que teve até casamento arranjado; e até Nelson Gonçalves que tinha fama de superdotado. 

“Acompanhe as trajetórias dos cantores de maior sucesso das décadas de 1940 e 1950. E descubra que, por trás das mais belas canções, escondem-se grandes histórias de caras que se dedicaram a uma paixão em comum: a música.”

Por Elenilson Nascimento

O livro “Os Reis da Voz”, de Ronaldo Conde Aguiar, foi simplesmente prazeroso e está cheio de curiosidades sobre a vida dos 15 principais cantores brasileiros da Era do Rádio: Francisco Alves, Mário Reis, Jorge Goulart, Orlando Silva, Cauby Peixoto, Carlos Galhardo, Vicente Celestino, Tito Madi, Nelson Gonçalves, Cyro Monteiro, Sílvio Caldas, Jackson do Pandeiro, Luiz Gonzaga, Germano Mathias e Moreira da Silva. O livro é uma grande e merecida homenagem não só a esses grandes cantores, mas também a todos os ícones de uma geração da música brasileira.

As vozes e emoções desses artistas chegavam ao público através das ondas do rádio, se alastrando pelo país e conquistando corações. Esta obra reúne um pouco da vida desses grandes nomes e traz um CD com interpretações únicas das canções mais conhecidas do período (*contudo, o meu livro não veio com o CD). Entre os anos de reinado do samba da primeira geração e a invenção da Bossa Nova havia um hiato na literatura acadêmica e musical brasileira. O livro de Aguiar joga luz sobre um aspecto pouco conhecido e raramente estudado – o das gravações radiofônicas do período que vai do fim da Segunda Guerra Mundial até a segunda metade da década de 1970, destacando produtores, radialistas, arranjadores e instrumentistas que fizeram sua história. Acompanhe as trajetórias dos cantores de maior sucesso das décadas de 1940 e 1950. E descubra que, por trás das mais belas canções, escondem-se grandes histórias de personagens que se dedicaram a uma paixão em comum: a música.

O autor analisa o rádio em seu papel aglutinador, exercido pela programação veiculada em tempo real (a música, a radionovela, o futebol). Os dramas e as glórias dos principais nomes da conhecida Era de Ouro são descritos com riqueza de detalhes. Do início da carreira de Francisco Alves – que foi um dos principais intérpretes de Noel Rosa; passando por Mário Reis que abandonou a sua vida burguesa da Tijuca (RJ) para cantar sambas do morro e foi aluno da lenda Sinhô e que, dizem, teve um caso com Carmem Miranda; Jorge Goulart que começou a carreira com apenas 17 anos e conheceu alguns dos maiores compositores renomados da época.

Segundo o autor, o cantor Mário Reis teve um caso tórrido com Carmem Miranda.

O livro descreve Orlando Silva que não viveu em um mundo risonho e feliz, mas se tornou uma lenda e sucumbiu ao uso abusivo de álcool e drogas; Cauby Peixoto que foi o Luan Santanna de sua época e teve até casamento arranjado para calar a boca da imprensa; o elegante Carlos Galhardo, que depois de Francisco Alves, foi o cantor que mais gravou no cenário artístico brasileiro; a triste história de Vicente Celestino que teve um sucesso arrebatador com a música “O ébrio” e conheceu também a decadência – e foi redescoberto pelo Brasil quando Caetano Veloso regravou “Coração materno”, em 1968; Tito Madi que se tornou um cantor de boate e considerado um dos cantores mais amáveis, mas que sofreu com a convivência com o, segundo o autor, “intratável e mal-educado” João Gilberto; Nelson Gonçalves que passou fome, foi reprovado em diversos teste, injuriado, andou na fina flor da malandragem, teve uma namorada que cometeu suicídio, se afundou na cocaína, foi preso por tráfico, mas virou uma das estrelas principais da nossa música; Cyro Monteiro que integrou o cast de outro da Rádio Nacional e da gravadora Mayrink, mesmo sendo um freelancer, mas foi considerado por Vinicius de Moraes o melhor cantor do Brasil; Sílvio Caldas que se tornou parceiro do poeta Oreste Barbosa e escreveu vários poemas musicados na historiografia da música popular e que, tempos depois, rejeitou o repertório da Bossa Nova; Jackson do Pandeiro que de menino pobre, que passou fome, se tornou uma referência.

A minha descoberta no livro Gonzaguinha não era filho de Luiz Gonzaga.

E quando você passa a vida inteira acreditando em uma coisa que na realidade não passa de mais um factoide. Acabei de descobrir na leitura de “Os Reis da Voz”, que o Gonzaguinha nunca foi filho biológico do Gonzagão. Nem pai de verdade e nem de consideração. Segundo o autor, o rei do baião era estéril devido as várias doenças sexuais que teve durante a vida pois vivia em puteiros e, provavelmente, Gonzaguinha era filho de Nelsinho do Trombone. Além disso, o autor ainda afirma que Gonzagão era um alienado político e não tinha constrangimento algum de tocar para militares e latifundiários, ao contrário de Gonzaguinha que tinha letras de protestos, tanto que é bem possível dizer que Gonzagão era indiferente às questões sociais das letras de muitas de suas canções.

O livro ainda fala do Germano Mathias que ganhou o prêmio Roquette-Pinto de revelação masculina, cabendo à Maysa o de revelação feminina; e o livro termina com a história do Moreira da Silva que, como Nelson Gonçalves, viveu parte da vida no limite exato da marginalidade. Outra história anexa que eu achei bastante interessante foi que no ano de 1915, trabalhando como repórter, Orestes Barbosa, com seu texto afiado, que o levou três vezes à prisão por crime de injúria, tornou-se uma espécie de cronista. Barbosa foir destacado para cobrir o “incidente da Escola Nacional”, que envolvia três estudantes e o diretor, um sujeito descrito como de “maus bofes”. Uma daquelas três estudantes, justamente a aluna agredida pelo diretor chamava-se Cecília Meirelles.

O livro é uma homenagem a todos os ícones de uma geração da música brasileira.

No livro de Aguiar ainda mostra que existia um encadeamento das músicas com as falas e uma presença importante dos produtores. Entre estes, o mais famoso na época, presente semanalmente na rádio Tupi do Rio de Janeiro, foi Almirante (nome artístico de Henrique Foréis Domingues), que, além de apresentador, também era cantor, compositor e, mais tarde, pesquisador de história da música popular brasileira. Este trabalho “Os Reis da Voz”, de Ronaldo Conde Aguiar, contribui para preencher uma lacuna na historiografia brasileira, que ainda não se concentrou como deveria na história do rádio e da TV. O livro incorpora uma massa documental significativa e articula a história do rádio à história da música brasileira. “O campo artístico brasileiro (e não só brasileiro), onde egos inflamados disputam espaços, públicos e prestígio à disseminação de fofocas e as tentativas efetivas de pulverização de reputações. Quanto mais prestigiados os personagens das intrigas, mais cabeludos eram (e são) os mexericos” (pág. 270). Em suma, um livro necessário não só para aqueles que gostam da boa música popular, mas para se conhecer mais da nossa própria história. (“OS REIS DA VOZ”, de Ronaldo Conde Aguiar, biografias, 367 pags, Editora Casa da Palavra – 2013)

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