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A repulsa ao “TEXTÃO” como sintomática marca de uma geração

Coluna de Pedro Del Mar sobre política, educação, cultura e muitos outros assuntos

Lá vem TEXTÃO

TEXTÃO! É, assim mesmo, em capslock. Essa simples palavrinha de 3 vogais e 3 consoantestornou-se comum nas redes sociais e vem sendo responsável por causar arrepios e calafrios em muitos internautas. Inserido comumente antes de textos longos, o termo funciona como uma espécie de sinal de alerta:Danger! Perigo!Mas porque textos relativamente grandes – na maioria das vezes não são tão grandes assim – devem ser precedidos de um alerta?

Um viés de raciocínio quepode-se adotar para explicar esse comportamento virtual é o fato de que cada vez mais as pessoas necessitam de serviços e hábitos ágeis em meio as atribuladas rotinas no trabalho, faculdade, trânsito e etc. Esse modo de vida demandaria informações e opiniões sucintas, condensadas e objetivas, não deixando tempo para a elaboração e consumo de ideias extensas e rebuscadas. Portanto, o aviso “textão” seria de fundamentalimportância para evitar um possível desperdício do cada vez mais precioso tempo do “homem moderno”.

Bom, como eu disse, a ideia acima é apenas uma das várias formas factíveis de abordar a questão. Assim, eu até posso concordar que esse (o tempo) seja um elemento que, de fato, faça sentido, mas desconfio que essa não seja uma explicação suficiente para esgotar o debate e que o buraco seja mais fundo. Explico.

Não é nenhuma novidade que o brasileiro pouco cultiva o hábito da leitura. Segundo pesquisa da Câmara dos Deputados 70% da população brasileira não leu NENHUM livro em 2014. Um número extremamente preocupante.

Somando-se a isso, a geração que nasceu em meados dos anos 90 e hoje possui vinte e poucos anos, que representa fatia considerável do percentual de usuários das redes sociais, cresceu ligada a formas virtuais de entretenimento e até mesmo de educação. Quantos, por exemplo, não tiveram cd-rom´s de versões virtuais das famosas enciclopédias que faziam sucesso naqueles tempos? Quantos cresceram acompanhando as gerações de Playstation´s e demais vídeo-games? Quantos, desde cedo, se habituaram a bate-papos na internet com o ICQ, UOL e até mesmo com o antigo MIRC?

Lá vem textão

Todos esses fatores tiveram uma inegável e significativa influência na construção de um novo modo de vida que invariavelmente afastou esta prole do hábito da leitura, especialmente das leituras densas e regulares, limitando-se, quase sempre, a pequenos e compactos textos, fomentando a crescente ideia do “quanto menor, melhor”.

Neste contexto, não surpreende que seja preciso alertar aos seguidores quando se resolve escrever um texto um pouco mais elaborado do que as habituais poucas linhas de sempre. O Twitter, com seus cento e poucos caracteres, que surgiu anos atrás com uma novidade, hoje parece ditar as regras da comunicação virtual. Escrever “textão”, segundo o implícito código de comportamento das redes sociais, definitivamente, não é algo “cool”, popular, legal.

Quando pensei em escrever estas linhas, resolvi observar os meus próprios textos em minhas próprias redes sociais. O resultado respondeu exatamente a minha hipótese inicial: os textos mais longos receberam um número bem menor de curtidas e comentários do que os textos mais curtos. E vale ressaltar que a temática destes textos, tanto os longos quanto os curtos, variaram bastante, abordando uma ampla gama de temas que são do meu interesse e, acredito eu, também de parte significativa dos meus seguidores.

Não tenho a pretensão de esgotar o tema e nem reduzir uma complexa questão, que envolve diversas variáveis, a somente uma possível preguiça que as pessoas tem diante de longas leituras. Mas, confesso que essa aparente tendência me preocupa e me entristece. A vida é demasiadamente complexa e diversa para limitarmos nossos relatos, experiências, ideias e opiniões a linhas tão curtas, a vocabulários tão pobres e expressões tão tímidas.

Lá vem textão

Podemos divergir em uma infinidade de questões, mas dificilmente você, caro leitor, irá discordar de mim quando digo o quão fundamental é o hábito da leitura na construção da cidadania de qualquer indivíduo. Isso, é evidente, não significa que devemos ler qualquer coisa, sem o crivo da crítica, sem o poder da seletividade. Claro que não. Ler é mais importante quando se prima pelo fator qualitativo em detrimento do quantitativo. Contudo, em meio a aparente infinidade de possibilidades que a internet nos oferece, achar algo interessante para ler não é um problema. Além disso, ainda que necessitemos de mais, as principais cidades do país possuem bibliotecas públicas, abertas a todos, com um significativo acervo em diversas áreas.

Assim sendo, que tal aproveitarmos esse começo de ano para lermos mais e melhor? E se me permitem uma singela e desinteressada dica, leiam esta coluna! rsrs =)

Pedro Carvalho (Del Mar) é graduando em Direito e em Ciências Sociais. Desde a adolescência participou ativamente de movimentos estudantis e sociais na Bahia e em Minas Gerais. À margem destas atividades, mas não menos importante, cultiva o hábito da escrita, sempre atento ao que acontece na política, sociedade, comportamento, educação, cultura e entretenimento no Brasil e no mundo.

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