Crítica

Crítica A Cabana: um filme bom, ótimo ou péssimo?

A Cabana

Dirigido por Stuart Hazeldine. Roteirizado por John Fusco. Baseado em A Cabana por William P. Young. Elenco: Sam Worthington, Octavia Spencer, Aviv Alush, Radha Mitchell, Alice Braga, Tim McGraw, Sumire Matsubara, Megan Charpentier, Gage Munroe

O filme A Cabana é originalmente um livro de título homônimo escrito pelo canadense William P. Young, lançado em 2007 nos Estados Unidos. Após ter sido consolidado como um best-seller literário, tendo vendido até então mais de vinte milhões de exemplares, naturalmente a indústria cinematográfica obteve a oportunidade de fazer sua adaptação e, dez anos mais tarde chega às telas dos cinemas brasileiros o longa tão esperado. Baseados nas próprias experiências de vida do autor, acompanhamos a jornada de Mackenzie (Mack, interpretado por Sam Worthington) Phillips para superar e curar-se emocionalmente de uma tragédia, qual seja, a morte de sua filha mais nova Missy.

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Infelizmente, desde o início o filme possui problemas narrativos de estrutura em sua execução. O primeiro ato extremamente fragmentado e acelerado apenas faz uso de flashbacks para abordar alguns pontos principais da vida de Mack em sua infância e, desta forma, o roteiro claramente o estabelece como uma vítima de abusos de seu pai. O resultado, todavia, prejudica tornar crível a mudança repentina de opinião do protagonista mais tarde por não dar mais camadas ao personagem, principalmente para aqueles que não estão familiarizados com a história do livro.  Até porque, o roteiro gira em torno de fazer Mack crer que está realmente vendo personificações físicas de Deus (Spencer), Jesus (Alush) e o Espírito Santo (ou Sarayu – Matsubara), enquanto trabalha efetivamente as dores internas. Mas quando tenta desenvolver ambas juntas acaba não desenvolvendo nenhuma das duas de forma apropriada, como se não quisesse lidar com o assunto.

Mas ainda que possua uma temática interessante do ponto de vista religioso, ainda foi possível explorar alguns questionamentos válidos, como a “existência do mal” na Terra. Contudo, é incompreensível que o material pregue e estimule diversas vezes valores contraditórios por meio de jogo de perguntas e respostas sem querer explorar os significados de suas assertivas. Se por um lado temos um jovial Jesus que rejeita a ideia de “escravos” seguidores de sua própria doutrina; ou então o fato de que Deus, conforme os próprios ensinamentos da personagem interpretada por Octavia Spencer é uma figura tão universal que possui vários nomes ao mesmo tempo em que não possui nenhum, o que nos transmite a ideia de que de alguma forma todas as religiões se conectam e, portanto, são iguais em sua essência; por outro lado nós testemunhamos posteriormente a Sabedoria (Braga) desconstituir todos esses valores ao final, ou seja, desaprender tudo o que tínhamos aprendido até então com seus sermões para reforçar o catolicismo como meio de salvação do mal, como ser “bem” ou ser “mal” depende se você é cristão ou não.

Em relação ao elenco multirracial da Santa Trindade, de fato foi essencial para que se desconstituísse a péssima visão caucasiana que a Igreja construiu suas figuras centrais em toda a sua história de existência, especialmente tendo em vista o retrato da família “tradicional” Phillips,  mas fato é que também o roteiro pretensiosamente se orgulhou disso desperdiçando tempo do espectador ao elaborar diálogos pífios para fazer Mack constatar que a aparência ou a fisionomia dos personagens não era nada do que ele imaginava toda vez que os encontra. Assim sendo, nada adianta fazer algo louvável ou inovador e ao mesmo tempo fazer propaganda do que se conquista, ao invés de encarar com mais naturalidade este elemento.

Essa ausência de capacidade em lidar exatamente com as várias questões que a história aborda, por conseguinte, também afeta no desenvolvimento da relação de Mack com sua outra filha Kate (Charpentier), a qual também se encontrou impactada com a morte da irmã. Aliás, como de fato a morte de Missy impactou todos e como cada um dos demais membros da família tentou lidar com a perda jamais fora abordada pelo roteiro além dos pontuais comentários de comparecer a um psicólogo, por exemplo, o que inclusive levou ao desfecho apressado e expositivo de um monólogo do assunto com a filha. A preguiça é tamanha, que o roteiro sequer justificou de maneira satisfatória a ausência da esposa e os dois filhos, que permanecem semanas longe de casa, apenas informando para onde vai sem nem ao menos sabermos o porquê e para quê, apenas esperando que o espectador aceite tais informações de prontidão.

Mesmo com uma grande história em suas mãos, A Cabana, por fim, transforma seus cento e trinta e dois minutos de projeção em uma jornada que não ousa aprofundar o próprio tema que discute.

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