Cena de Malévola
Entre defeitos e virtudes, Malévola se mostra como uma interessante experiência para a garotada
Por Luis Fernando Pereira
O cinema vem passando ao longo das últimas décadas por várias mudanças, seja no modo de produzir um filme, seja nos elementos técnicos (e tecnológicos), e seja no estabelecimento e desenvolvimento de roteiros e narrativas. Uma destas mudanças diz respeito ao cada vez mais inexistente uso daquela ideia maniqueísta de separar claramente o bem do mal. Víamos muito isso em filmes infantis, sobretudo os da Disney, onde detectávamos bem rapidamente quem seria o vilão e quem seria a mocinha da história. Algumas produções mais recentes buscaram então humanizar os vilões, ou então tornar mais reais os mocinhos, diminuindo aquele tom idealizado que eles sempre carregavam.
Muitos achavam que Malévola – mais recente produção da Disney – e dirigido pelo estreante Robert Stromberg, iria elevar ao máximo esta perspectiva, principalmente pelos trailers que foram sendo jogados ao público durante todo este tempo de produção do projeto. Porém, quando terminamos de assistir ao filme, o que vimos é algo ainda mais surpreendente: o que a Disney fez foi simplesmente subverter totalmente esta ideia enraizada de que a personagem principal deste filme seria uma vilã má (com seus motivos, mas ainda assim, uma vilã) e tornou a Malévola de 2014 a grande heroína da história, o grande exemplo a ser seguido.
Vamos entender melhor tudo isso: o filme é baseado no conto da Bela Adormecida e narra a história de Malévola, a linda Angelina Jolie, uma mulher que, movida pelo sentimento de vingança, coloca um feitiço em Aurora (a também linda Elle Fanning), a filha do rei; esse, um ex-amigo de infância de Malévola. No feitiço fica dito que Aurora, ao completar seus dezesseis anos, entrará em sono profundo e somente acordará se receber um beijo movido pelo amor verdadeiro. É esta basicamente a premissa de tudo o que vemos no filme.
Acontece que esse dito sentimento de vingança que leva Malévola a colocar o feitiço em Aurora é bastante compreensível e decorrente da traição sofrida por ela pelo seu então melhor amigo, que viria a ser o Rei. Ainda assim, esse sentimento é anulado com o passar do tempo e com a convivência das duas, a ‘vilã’ e a ‘mocinha’. Elas passam a desenvolver uma relação muito mais amorosa que a desenvolvida entre Aurora e seu pai, ou entre Aurora e suas três tias fadas. E ainda, em todos os momentos da história – do início até o seu final, Malévola somente reage, nunca age por livre e espontânea vontade de fazer o mal.
Malévola Elle Faning e Angelina Jolie
Esse elemento é bem interessante, já que desde o começo que os humanos buscam adentrar ou destruir a floresta que serve de lar para a fada Jolie e seus habitantes. E o sentimento de vingança que permeia por toda a história é muito mais sentida no rei, que busca a todo instante destruir e até mesmo matar a personagem que dá título ao filme.
E por fim, o amor verdadeiro que se tornou um elemento bem icônico na história da Bela Adormecida, nesta versão da história é dado por ninguém mais, ninguém menos que… a própria Malévola. Mais heroína que isso impossível.
Dito isso, alguns pontos extras que não poderia deixar de mencionar:
Primeiro, o termo Bela Adormecida fica aqui um tanto descaracterizado, haja vista que Aurora não ficou nem uns minutinhos sequer em sono profundo. Muitos cochilos dados depois do almoço são mais longos que seu sono infinito.
O trabalho visual do filme chama bastante atenção e é resultado direto da escolha do diretor, que trabalhou como designer de produção em filmes como Alice no País das Maravilhas e Avatar. Percebe-se claramente tais influências, sobretudo de Avatar. Mas ele peca por não conseguir construir uma identidade para o projeto, que é aparentemente dark, com uma vibe bem gótica, mas que se contrapõe com a história, bem boba e sem densidade dramática alguma.
Malévola (Angelina Jolie) – Divulgação
Sim, Angelina Jolie reina quase que exclusivamente no filme. Nota-se que desde o início, essa era a intenção, pois a quantidade de closes em seus lindos olhos é bastante significativa. Angelina ao menos faz a ida ao cinema valer a pena. Já o pouco que sobra fica para a bela Elle Fanning, uma das mais promissoras atrizes de sua geração e que transborda de beleza (e não me refiro à beleza física).
Assim, entre defeitos e virtudes, Malévola se mostra como uma interessante experiência para a garotada, pois foge um pouco das tradicionais histórias infantis. Com uma bela fotografia e um trabalho visual chamativo, o filme acaba agradando aos olhos. No campo narrativo, bem, é sempre um prazer ver Angelina Jolie e Elle Fanning atuando, ainda mais juntas num mesmo filme. Isso é motivo suficiente para não se desesperar ao fim da história.