Crítica

Crítica: “O Assassino – O Primeiro Alvo” é bom, ótimo ou esquecível?

O Assassino: O Primeiro Alvo

Direção por Michael Cuesta. Roteiro por Stephen Schiff, Michael Finch, Edward Zwick, Marshall Herskovitz, Baseado no livro American Assassin por Vince Flynn. Elenco: Dylan O’Brien, Michael Keaton, Sanaa Lathan, Shiva Negar, Taylor Kitsch

Por Gabriella Tomasi

Há certo apelo em filmes de espiões que atrai o grande público, pois de fato há elementos que são bastante interessantes de trabalhar. Oriundo dos gêneros policiais dos filmes noir das décadas de 40-50, tramas envolvendo espionagem, organizações criminosas e um agente que se destaca dentre os demais possuem grande potencial para desenvolver mistérios, ação e intriga. Muito disso se almeja em O Assassino, até porque diante de sua estréia próxima à data de 11 de setembro, perceberemos que sua temática se revela pertinente para o povo estadunidense ao trazer uma trama envolvendo ataques terroristas e conspiradores. Embora seja visível o esforço dos quatro roteiristas em confeccionar algo inteligente e envolvente, o resultado não chega para além do risível.

Nesta história, conta-se a jornada do herói Mitch Rapp (O’Brien), uma pessoa comum que enquanto estava de férias com sua namorada, lhe pede em casamento. Em meio à comemoração dos recém-noivos, o ataque terrorista na sequencia inicia um massacre de todos os turistas e pessoas presentes naquele resort e, ao final, acabam assassinando a sua noiva. Sobrevivente desta tragédia, mesmo após mais de um ano, Mitch ainda não esqueceu o acontecimento, ficando obcecado com seu inimigo, o conduzindo a uma vida de rigorosos treinos e uma missão bastante específica de se vingar do homem que matou a sua amada e, para tanto, tenta se infiltrar no exército islâmico fingindo ser leal à sua causa. Seu envolvimento consequentemente desperta o interesse da CIA, em particular da sua diretora Irene Kennedy (Lathan), que o passa para o comando de Stan Hurley (Keaton) para impedir uma nova Guerra Mundial de se instaurar.

Infelizmente, mesmo uma premissa interessante não é o suficiente para evitar o desastre que é esse filme, desde os seus primeiros minutos. Há tanta coisa errada que nem saberia por onde começar: mesmo com vários disparos de arma, não se explica como o protagonista milagrosamente sobrevive; o ataque terrorista no resort não possui explicação alguma; a facilidade de Mitch entrar em contato com líderes islâmicos importantes mais rápido que a CIA é patética; a tal vingança do protagonista nunca realmente possui um desfecho satisfatório, servindo apenas como uma justificava para Stan mexer mais com a cabeça do menino do que os outros recrutas. Além disso, a decisão abrupta de recrutamento de Mitch parece demasiado artificial, ou seja, a explicação reiterada (até a exaustão!) de que ele teria potencial para trabalhar para a inteligência americana sem qualquer aprofundamento do que seria realmente esse potencial não é exatamente convincente. Nem os treinamentos “super rigorosos” de Stan, como uma tentativa de equiparar o seu trabalho a do exército militar é pífio, já que apenas coloca seus recrutas para lutar judô entre si e ensinar a manusear armas. Os acontecimentos chegam a ser risíveis de tão absurdos quando uma montanha de incoerências invade as telas durante a missão: uma espiã turca que de uma hora para outra é um possível interesse romântico, depois uma traidora, depois uma aliada; uma diretora da CIA que não assiste ao noticiário; um refém que simplesmente é esquecido no porta-malas de um carro, banhado em querosene e um cigarro aceso na boca; uma bomba muito fácil de ser manipulada; uma supervisora que perde um celular, e também Mitch, mesmo insistindo em falar que não sabe aonde ele foi ao ter desaparecido, sendo que minutos antes, o protagonista já mencionara as suas intenções. Sinceramente, se a CIA realmente trabalha dessa forma, então estamos perdidos nesse mundo.

Michael Cuesta, por sua vez, costuma ser um diretor competente, tendo em seu currículo bons filmes do mesmo gênero como O Mensageiro (2014) e tratando com maestria temas mais delicados como a pedofilia em L.I.E. (2001). Mas em O Assassino o cineasta sequer parece ter o mínimo de empenho para criar um senso de urgência e/ou suspense para envolver seu espectador: os personagens passam menos de cinco minutos por cada cenário e; as coreografias das lutas são horrendas, sendo perceptível a sua encenação como se estivéssemos vendo uma luta de judô entre dois adolescentes para a olimpíada do colégio, pois ao invés de trabalhar os golpes de maneira séria, crível e que possamos ver de perto, Cuesta aposta em uma câmera subjetiva e tremida, com cortes rápidos, sempre da perspectiva de um personagem que desfere golpes em seu contra-campo, raramente podendo ver aonde e como o ferimento aconteceu no oponente. O senso de urgência cai por terra quando, por exemplo, não temos nem noção da contagem regressiva de uma bomba, sempre dependendo dos personagens dizerem quanto tempo lhes resta, fazendo disto, por conseguinte, uma abordagem bastante manipulável para conduzir a narrativa de forma conveniente até um desfecho bastante previsível. Aliás, um desfecho que também é pouco crível após jogar uma bomba atômica no mar sem a mínima preocupação posterior em mostrar os efeitos devastadores de centenas de mortes de soldados da marinha simplesmente acabando com uma frase do tipo: “perdemos algumas vidas, mas você salvou milhares de outras”, como se fosse pouca coisa.

Por sinal, convém mencionar que Dylan O’Brian parece ser uma das escolhas mais equivocadas neste elenco, pois a tentativa de passar uma imagem clichê de “bad boy” que se recusa aceitar ordens e a hierarquia em nome de uma “causa maior e pessoal” como Tom Cruise normalmente interpreta seus personagens, aqui Mitch não convence. Nem se consegue convencer nenhum dos demais personagens de tão caricatos e superficiais que são: Irene passa a vida dando ordens e defendendo cada atitude inconsequente de Mitch simplesmente porque ele “tem potencial”; o treinador Stan que adora desafiar gratuitamente seu aprendiz em forma de bullying sem propósito; uma espiã que nunca chegamos a conhecer quem ela é e de que lado ela está e, para completar; vilões com motivações ridículas.

O Assassino, portanto, é o produto de um filme esquecível que nunca chegamos a nos importar. Afinal, como fazer isso se nem o próprio longa se importa com si mesmo?

Gabriella Tomasi é crítica de cinema, graduanda em letras, membro do coletivo de mulheres críticas de cinema – ELVIRAS, e possui o blog Ícone do Cinema

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