Rei Arthur
Direção por Guy Ritchie. Roteiro por Joby Harold. Elenco: Charlie Hunnam, Àstrid Bergès-Frisbey, Djimon Hounsou, Aidan Gillen, Jude Law, Eric Bana
Por Gabriella Tomasi
Como o próprio título denuncia, o novo longa dirigido por Guy Ritchie conta a história do lendário Rei Arthur, o líder-monarca que historicamente defendeu a Grã-Bretanha diversas vezes de invasores no final do século V e início do século VI. Na trama do filme, seu pai o então rei Uther Pendragon (Bana) é assassinado como uma vingança de seu irmão Vortigern (Law) e então este torna-se rei dos Bretões em Camelot. Arthur (Hunnam) consegue escapar e encontrar refúgio na vila de Londinium ainda criança, onde fora criado por prostitutas em um bordel. Anos mais tarde, o protagonista irá encontrar seu destino e terá que lidar com o seu passado para se assumir como o legítimo herdeiro e, dessa forma, deter os planos malignos da tirania de seu tio.
Como se pode perceber pela leitura da sinopse, esta é uma história com uma trama que vemos constantemente nos típicos filmes clichês de super-herói e aqui não é diferente do que se esperar. É o mocinho em uma jornada de auto-conhecimento e auto-aceitação para então acabar com as forças do mal que ameaça inocentes. No entanto, como a narrativa vai ser trabalhada para contar essa história é que é o diferencial aqui. E aí, gosto é gosto e não se discute: ou o espectador vai amar ou vai odiar; dificilmente haverá um meio termo.
Esse resultado se deve ao estilo particular do diretor Ritchie em contar as suas histórias. Rei Arthur: A Lenda da Espada se baseia em três elementos para chegar ao produto final que temos no cinema: frame rate, elipses e edição. O primeiro é a quantidade de quadros por segundo que determina a velocidade com que a imagem será transmitida em tela. Em outras palavras, podemos ver uma imagem bastante acelerada ou lenta, também os chamados slow-motions. O cineasta brinca essa técnica: O. Tempo. Todo. E aí se torna demasiado cansativo presenciar imagens e planos de uma cena que começam em uma freqüência ultra-rápida e que de repente podem terminar lentas demais pela enésima vez. A técnica é eficiente em alguns momentos, claro, principalmente nos combates com o uso da Excalibur. Todavia, outras nem tanto, pois o ritmo em geral se torna tão frenético, mas tão frenético que fica praticamente impossível nos aproximar dos personagens, e desenvolver qualquer empatia em relação a eles, pois o filme não nos concede esse tempo. Ainda, não concede tempo o suficiente para ter momentos de alívio e, deste modo, para que possamos absorver as informações, pois todas são acumuladas e jogadas constantemente ao espectador. É uma urgência que não cessa, que não nos dão muito descanso; um artifício apenas para maquiar a fragilidade e a superficialidade de seu roteiro. E não somente em relação ao fator humano de toda a trama que sequer é trabalhada por pura preguiça, mas a adaptação “moderna” é simplesmente sofrível por nos depararmos com elementos absurdos de seus diálogos que destoam deste mundo, como o fato de um treinador chinês se chamar “George” ou um dos personagens mencionar “folha de pagamento” (sim, porque na época medieval já existiam leis trabalhistas, né).
Rei Arthur
A elipse, por sua vez é o elemento que vai definir a forma de edição deste filme e, portanto, os dois elementos trabalham juntos na sua execução. Ela é uma técnica usada para manipular o tempo da narrativa, suprimindo informações e/ou imagens que são preenchidas mentalmente pelo espectador, sem prejuízo do seu conteúdo ou da compreensão da história. Pois bem, Rei Arthur: A Lenda da Espada funciona dessa forma. A história vai e volta no tempo, avançando e depois recuando um pouco para preencher esses “vazios” deixados, e é neste ponto que a edição trabalhou. Ocorre que, embora eficaz em alguns momentos como quando o rei Vortigern expressa seu deleite em estar no poder e ter poder ou então mesmo no desfecho da trama no terceiro ato, fato é que muitos desses “vazios” não precisavam ser preenchidos ou tornam algumas cenas completamente anticlimáticas e, dessa maneira, não contribuem muito à narrativa.
Outro ponto é que Ritchie também se apropria constantemente da linguagem de vídeo-game neste longa. Há a exploração de tudo o que há de melhor neste elemento, mas também de pior. Seja nos ângulos e enquadramentos empregados, seja da trilha sonora alta e empolgante, algumas cenas e muitos efeitos nos lembram tanto a atividade lúdica e o CGI é tão intenso que aparentam até artificiais demais de tal ponto a distanciar do lado intrínseco do que todo o conflito representa. O filme aparenta querer só contar uma sucessão de treinos, combates e crises que nos remetem à fases de jogo até o final.
Mesmo assim, é admirável que o diretor ainda tenha um controle a ponto de não tornar a história incompreensível, mas fato é que, como mencionamos, a velocidade da narrativa e com uma edição extremamente fragmentada nos afasta dos personagens, de seus arcos e nuances emocionais, para um filme que só deseja ressaltar o entretenimento da ação. A impressão que fica é que Guy Ritche intencionou fazer um espetáculo visual com técnicas refinadas e chamar a atenção para um estilo próprio. Sua pretensão é tamanha que a história em si foi deixada completamente de lado para esconder os próprios defeitos dela e, assim, querer se fazer notar. O que é um equívoco quando se trata de um filme introdutório a possíveis futuras sequencias dentro de uma franquia.
Por fim, Rei Arthur: A Lenda da Espada é o resultado extremamente irregular; uma técnica que possui uma vida própria de tal forma a ofuscar a falta de substância em seu conteúdo, e quem achar algum tipo de entretenimento mesmo assim, poderá muito bem apreciá-lo.