Música

Fãs imergem no universo mágico, belo e poderoso de Maria Bethânia

Maria Bethânia – Foto de Mila Cordeiro

Bethânia se apresentou na noite desta sexta-feira no Teatro Castro Alves, na capital baiana, e fez o público externar – para o bem e para o mal – toda a admiração sentida pela cantora

Por Luis Fernando Pereira

Maria Bethânia é um universo à parte.

É normal que apresentações de grandes nomes de nossa música – Chico, Caetano, Gal, Milton… – sejam carregadas de emoção, fazendo-nos adentrar em um mundo surreal, de sonhos realizados. Mas com Bethânia acontece algo diferente. Sua apresentação mais parece, e funciona, como uma imersão ao mundo mágico do qual ela, e somente ela, faz parte. Seus shows são horas de catarse continuada, não tão explosivas quanto um show de punk rock, mas infinitamente mais intensas que qualquer outra experiência mundana.

E se suas apresentações tradicionalmente já são inesquecíveis, imaginem então o que seria de uma turnê comemorativa de 50 anos de carreira?

Pois bem, não precisamos mais imaginar, pois tal turnê – chamada carinhosamente de Abraçar e Agradecer – está em curso pelo país, passando neste final de semana pela capital baiana. Bethânia começou, na noite desta sexta-feira, 28 de agosto, sua tour soteropolitana e fez o Teatro Castro Alves se transformar no quintal de sua casa.

O show
O show realmente é especial, e o foi desde os segundos iniciais, quando as luzes do fundo do icônico palco se acendem e de lá surge uma Bethânia entusiasmada, feliz, que já chega ao microfone soltando os primeiros versos de Eterno em mim, do irmão Caetano Veloso.

O cenário, responsabilidade da talentosa cenógrafa Bia Lessa, ajuda na imersão do público ao show, criando uma atmosfera bem sutil e elegante. Bethânia possui total controle sobre o palco e consegue dominá-lo sob a plataforma elevada, que muda de cor, de iluminação e que exibe diversas imagens, tudo dependendo, claro, da canção que está sendo executada.

Maria Bethânia – Foto de Mila Cordeiro

O setlist é uma verdadeira ode ao seu legado e uma bela homenagem aos grandes nomes da música nacional. O público cantou Raul, Chico Buarque, Gonzaguinha, tudo na voz vigorosa e absolutamente cristalina da cantora nascida em Santo Amaro, histórica cidade da grande Salvador.

O roteiro do show transparece certa rigidez, como se ele fosse meticulosamente pensado daquela forma e assim sair do script seria algo – ao menos em teoria – impensável. Mas Bethânia é um pouco isso: não precisa se descabelar para fazer seus fãs a adorarem. A dinâmica, bem simples, que faz somente a cantora subir ao palco e cantar, é suficiente para agradar em cheio a todos em suas apresentações.

Educação
Quanto ao público, há questionamentos para se fazer e uma grande pergunta se torna pertinente: o que a contemporaneidade fez com essa sociedade? Essa geração mídias sociais, mas que valoriza cada vez mais o indivíduo em detrimento do coletivo, tem trazido experiências bem chatas em shows como este (e em eventos de arte em geral). Bethânia, por exemplo, foi interrompida algumas vezes porque algumas pessoas se achavam no direito de gritar coisas do tipo: ‘gostosa’, ‘maravilhosa’… Era a interrupção pela interrupção, como se a pessoa pensasse: “eu paguei, tenho direito de ser protagonista também”.

A experiência deixou de ser coletiva, e o que vimos foi uma bateria de Smartphones filmando a cantora, mesmo que o indivíduo estivesse ali em frente à cantora, e mesmo que soubesse que seu ato atrapalharia de alguma forma o trabalho da artista. Uma parte do público (como da sociedade) não se predispõe mais a querer transformar uma experiência como esta em algo memorável para todos. O que eles desejam é que seja memorável somente para ele.

Desfecho catártico
Mas este público no geral é lindo, e já ao final da primeira apresentação da cantora no TCA, boa parte dos fãs se dirigiram ao gargarejo, bem perto do palco, e enlouqueceram com a música que serviu de bis para o show, o hino O que é, o que é, de Gonzaguinha.

E foi assim, de modo mágico e realmente catártico que a cantora se despediu de seus admiradores, de seus súditos. Elegante, vigorosa, sutil e poderosa… falar de Bethânia é, em regra, se utilizar de adjetivações deste tipo. Querer argumentar e compreender seu talento soa desnecessário e sem sentido. A dica então é somente fechar os olhos e imergir no mundo mágico de Bethânia por algumas horas.

A experiência será inesquecível.

Luis Fernando Pereira é crítico cultural e editor/administrador do site

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