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Festival 5 Minutos 2011 – Programa 1

Festival Nacional 5 Minutos

Ontem (01/11/2011) teve início a décima-quarta edição do Festival Nacional 5 Minutos, um dos mais interessantes eventos do calendário cinematográfico baiano e que cada vez mais adquire importância fora de nossas fronteiras. Este ano, por exemplo, dos 50 vídeos selecionados para a mostra competitiva, 32 são de outros estados, ficando a Bahia representada por 18 vídeos.

O festival exibirá também o Panorama Nacional, programas com todas as obras inscritas no evento, sendo 220 vídeos divididos em 16 programas de 1h cada. Além disto, ocorrerão diversas oficinas de audiovisual, debates sobre o mercado de curtas-metragens no Brasil, workshop, mostra de vídeos infantis, dentre outras atividades. A mostra competitiva (a que mais importa) foi dividida em quatro programas de 1h, sendo que o primeiro deles foi exibido ontem, na abertura do festival. A seguir, comentários sobre cada um dos vídeos:

1. 5 Minutos, de Quico Meirelles (2011, São Paulo – SP).
[Fernando]
Curta-metragem ambientado em Londres e protagonizado pela atriz global Maria Flor. Trata-se de 5 minutos de divagações sobre a própria ideia do que se pode fazer em cinco minutos. Possui um texto bem dinâmico e a história é de uma razoável simpatia, apresentando um casal conversando sobre elementos que fazem parte da relação deles. Lembra vagamente Apenas o fim, ótimo longa-metragem de Mateus Souza.

[Cristiana] O fato de partir de uma proposta de pensar as várias possibilidades de acontecimentos que podem durar cinco minutos faz o vídeo passar sem sentir e o deixa descontraído e agradável de se ver, além do mais, tem uma excelente atriz protagonizando o curta, o que torna mais suspeito falar de sua boa atuação. A forma com que falam dos problemas de relacionamentos que envolvem o casal também é bem interessante e valeu a escolha de abrir o festival 5 minutos com um curta homônimo.

2. Em Nome do Pai, de Marcelo Abreu Góis (2011, Lençóis – BA).
[Fernando]
História bem interessante sobre o processo de mudança (religiosa) espiritual, representada pela transformação de um homem num curandeiro. Boas tomadas de câmera, mas só.

[Cristiana] Esse curta é parte de um documentário intitulado Curandeiros de Jerê que conta a história de Ademário, Ogan da Casa de Jarê de Pai Gil de Ogum, exibido no último Panorama Internacional Coisa de Cinema. Para quem viu todo o documentário, o curta de 5 minutos parece ser incompleto e faz querer ouvir mais sobre a história. Entretanto, por ser baseado num personagem real e nessa experiência de se tornar alguém responsável pela cura alheia, o curta tem seu lugar, sobretudo, pela boa fotografia.

3. O Diário da Terra, de Diogo Viegas (2010, Rio de Janeiro – RJ).
[Fernando]
Pequena (01’12”) animação sobre o dia a dia de uma garotinha. Trabalho muito simpático, mas sem um poder narrativo suficiente para vislumbrar algum prêmio no festival.

[Cristiana] As frases são reflexivas (alguma coisa do tipo: “a terra está triste porque as pessoas machucam ela), mas como é próprio da maioria das animações, a linguagem é direcionada para as crianças, aliás, toda a narrativa é feita numa voz infantil. A criança abre um diário, como se a Terra fosse a dona dele e lê, ao mesmo tempo faz uma espécie de reflexão sobre os sentimentos da terra. Essas histórias são todas ilustradas com desenhos. A frase final: “vai chegar o tempo em que a própria página da terra vai ser a última” arrancou um sonoro ownh da platéia, como se esse som dissesse que o curta é mesmo fofo.

4. 24 Mil Beijos, de Uelter R e Fabiano Passos (2011, Salvador – BA).
[Fernando]
História de um relacionamento amoroso, contada através dos números que fizeram (e fazem) parte da vida dos dois. Trata-se de um vídeo que se propõe (pela linha narrativa) oferecer elementos de drama, e neste sentido peca por não o fazer com espontaneidade, soando muitas vezes mecanizado. A ideia de ilustrar um namoro pelos diversos números que o constituem (quantas relações sexuais, quantos beijos…) se mostra interessante, mas não original. Bom trabalho, mas nada além disso.

[Cristiana] O curta conta a história de um relacionamento que vem passando por algum tipo de crise e que tem, a partir da figura masculina, o pedido de perdão. Em meio a esse desejo de reconciliação ele conta a história dos dois a partir dos números: quantidade de abraços, de encontros, etc. A aceitação do pedido de desculpas pela menina através de um beijo somaria um total de 24 mil. O Curta não é ruim, mas soou mecânico do início ao fim.

5. Devir-Animal, de Cláudio Azevedo (2010, Rio Grande – RS).
[Fernando]
Projeto experimental bem curto, não chegando a dois minutos de duração, porém muito interessante. Mostra uma câmera (subjetiva) instalada dentro de uma espécie de gaiola, sugerindo assim uma reflexão sobre o viver contemporâneo. Oferece uma sensação bem forte de aprisionamento, dando realmente elementos para uma discussão mais abrangente sobre essas temáticas. Bem cru, mas com razoável poder imagético.

[Cristiana] Imagem única vinda de uma arapuca ou gaiola que tenta mostrar a angústia de alguém, provavelmente um animal, que estaria do lado de dentro. O filme é ousado, já que bem curtinho e de câmera fixa, entretanto, consegue passar um sentimento de aprisionamento que parece ter motivado todo o projeto.

6. Ensaio Para a Morte, de Adriele Escarlytte, Rafael Lins, Puebla Rodriguéz e Júlia Machado. (2011, Aracaju – SE).
[Fernando]
Trabalho bem ousado, mostrando uma interligação muito interessante da arte com a chamada ‘vida real’. Elas muitas vezes se fundem e este curta acaba transpassando esta sensação de que a vida muitas vezes não passa de uma encenação teatral. Há certo incômodo na interpretação da protagonista, mas nada que desqualifique o trabalho final.

[Cristiana] Apesar de já deixar claro desde o início que provavelmente o que se sugere o tempo inteiro, desde a primeira tomada de cena, não acontecerá, o curta consegue surpreender em algum sentido. A escolha do figurino, da disposição e arrumação das coisas no quarto do personagem principal deu um tom elegante ao curta. Entretanto, ele peca por não ter uma atriz com tanta expressividade, soando mesmo mecânica e pouco real em suas falas. Mas a idéia em si parece bem interessante.

7. A Feira, Patrimônio Imaterial, de Fabíola Aquino Coelho (2011, Salvador – BA).
[Fernando]
Vídeo-documentário relacionando os problemas vividos pelos feirantes na antiga feira de Água de Meninos (anos 60) com os apresentados na atual feira de São Joaquim (2011), maior mercado ao ar livre do Brasil. Percebe-se que este trabalho faz parte de algum projeto mais abrangente, sua importância, ao menos, sugere isto. Interessante, muito mais pela sua relevância histórica do que pelos artifícios narrativos ou audiovisuais.

[Cristiana] O curta mostra desde o início que ele não se esgota ali, ou mesmo, que é parte de uma pesquisa mais abrangente. É um documentário que apresenta uma problemática que apesar de ter surgido décadas atrás em um outro lugar parece bem atual já que referencia não só a antiga feira de Água de Meninos, mas a Feira de São Joaquim. Quem já esteve em uma ou em outra percebe que a temática é bem real e mesmo ou talvez…bem política. O curta traz uma expectativa para algo que está fora dele, mas nem por isso menos interessante.

8. Wilma, de Eva Jofilsan (2011, Recife – PE).
[Fernando]
Animação muito criativa, com grande poder simbólico e que trabalha bem a ideia de como a cor vermelha relaciona-se ao longo do tempo com a vida da personagem. Cria uma empatia quase automática com o espectador, principalmente com os que conseguem perceber algo a mais nos elementos que a animação oferece.

[Cristiana] O curta conta a história de uma menina que nunca teve notoriedade nos anos iniciais de sua vida e que teve sua timidez exposta pela família em função de um acontecimento natural. Por obra do destino, esse acontecimento está relacionado a cor que ela nunca gostou: o vermelho. Depois dessa exposição indiscreta ela faz todas as suas escolhas moldadas por um sentimento reflexivo que sempre a acompanhou. Talvez haja uma identificação imediata do universo feminino com Wilma, já que normalmente chega a fase adulta acompanhado de um constrangimento próprio de um acontecimento aparentemente bobo, mas com um grande significado para quem se vê envolvido por ele. É uma animação com história e reflexão para/ou de adultos.

 9. Matzeiva-Juliano Mer-Khamis, de Silvio Tendler (2011, Rio de Janeiro – RJ).
[Fernando]
Vídeo que destoa dos demais por apresentar a história do pacifista israelense Juliano Mer-Khamis, que morreu lutando por direitos igualitários para Palestinos e Judeus. É um trabalho muito denso, filmado fora do Brasil e com um olhar mais global sobre os acontecimentos recentes (não tão recentes) no Oriente Médio. Merece uma contextualização maior para que a homenagem acabe funcionando melhor, mas ainda assim é merecedor de elogios.

[Cristiana] A realidade do documentário por si só demonstra seu poder de toque. As imagens são belas e a causa humanitária que o move traz um tom reflexivo todo especial. “Os tiros fundamentalistas” que o mataram não foram suficientes para calarem a mensagem imortal de Juliano. Essa é a idéia principal do curta. A causa dele, mesmo que não seja tão atual, está ainda presente em muitos conflitos e isso faz refletir sobre o nosso papel social e por conta disso já merece destaque.

10. Bomtempo, de Alexandre Dubiela (2010, Belo Horizonte – MG).
[Fernando]
Outra animação bem curta (1’30”) e muito simpática, que faz um jogo entre as cenas vividas pelo personagem e o seu trabalho profissional. Bem simples, causa simpatia, mas nada além disso.

[Cristiana] Animação que fala de um apresentador de TV responsável pela previsão do tempo. Ele sai de casa e passa por todos os climas: sol, chuva, etc. A impressão é que ele chega para dar a previsão depois de já ter passado por elas, como se ele fosse anunciar que vai chover, depois de ter passado pela chuva e assim por diante. O curta é bem galante, mas não se sabe bem o que quis propor.

11. 3×4, de Caue Nunes (2010, Campinas – SP).
[Fernando]
Vídeo possuidor de uma proposta muito instigante, que tenta trabalhar a relação entre o querer ser algo (no caso, escritor) mas não se achar com poder sê-lo. Possui umas colagens de imagens que deixam o curta fluir bem, mas ao final não oferece nenhum elemento impactante, prejudicando uma boa proposta. Trabalho somente razoável.

[Cristiana] As frases iniciais que levantam os questionamentos sobre o quanto do que dizemos ou fazemos é de fato nosso criam uma boa expectativa, ou seja, a proposta do curta é bem interessante, entretanto, as reflexões não são tão aprofundadas e a frase que o personagem traz como sendo inédita ou própria faz ele parecer uma pessoa boba. A mensagem que impulsiona o curta, portanto, se perde no final.

12. Alan do Rap, de Diego Lisboa (2011, Salvador – BA).
[Fernando]
Melhor (um dos melhores, ao menos) vídeo apresentado no Programa 1 e que narra ao longo de cinco minutos todos os principais momentos da vida do personagem título do curta, desde o seu ápice (‘invadir’ um show de Alpha Blond) até seu declínio, numa prisão da cidade. A história é contada com uma força narrativa admirável, fazendo o espectador querer saber ainda mais sobre os acontecimentos da vida do personagem (Alan do Rap). O trabalho de câmera é cru, simples, mas assim o roteiro acaba sobressaindo-se, contando com bastante dinamismo toda uma história de vida em poucos minutos.

[Cristiana] A história já encanta quando Alan mostra duas fotografias: uma dele quando pequeno e a outra da mãe, ele as guarda com um carinho e cuidado que parece contagiar. Também traz um tom elegante quando ele diz que achou um livro de Vinícius de Morais no lixo e que não poderia deixar de pegar, diz algo do tipo: “como alguém pode jogar um livro de Vinícius no lixo?” Acompanhar o auge (quando ele sobe ao palco) até o momento atual na prisão é mesmo tocante. A narrativa torna-se ainda mais interessante por já conseguir mostrar em poucos minutos uma realidade que o envolveu e o envolve. É ainda melhor quando parece mostrar seu olhar arrependido confirmado por sua frase de agradecimento ao Alpha Blond por tê-lo recebido no palco. Trabalho simples, mas bem agradável de ver.

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