Cidade Baixa
Depois da exibição dos filmes foi aberto o debate propriamente dito, na verdade foi mais uma conversa informal entre o cineasta e o jornalista e crítico de cinema João Carlos Sampaio
Por Cristiana de Oliveira
Ontem (quinta-feira – 15 de março) teve início em Salvador mais uma edição do Festival de Cinema Universitário da Bahia (FCU), que continua até dia 18 em Salvador, no Cine Cena Unijorge, no Circuito Saladearte cinema do Museu e na Unijorge.
A noite de abertura foi dedicada ao cineasta baiano Sérgio Machado, grande homenageado do festival e diretor de filmes como Cidade Baixa e Quincas Berro D’água, além de séries como Alice (HBO Brasil). Porém, no dia de ontem os filmes exibidos não foram longas, mas sim dois de seus curtas-metragens. O primeiro, Troca de Cabeça, de 1993, é um trabalho de finalização de curso, na época em que Sérgio ainda era estudante de comunicação da Universidade Federal da Bahia. Como a cópia só existia em VHS, foi necessário fazer a conversão para que fosse exibida na telona, o que por um lado prejudicou um pouco (só um pouco mesmo), mas por outro deu a real ideia da atmosfera, tanto da história, como do processo de filmagens. A história do curta é bem bacana, chega a ser engenhosa toda a construção narrativa, desde o primeiro plano, quando um rapaz é acordado pela mãe e levado a sair para pagar uma dívida no outro lado da cidade, até o seu desfecho, bem revelador. A trama possui todo um ar de mistério e a cada movimento feito pelo protagonista, o espectador vai conjecturando o que virá em seguida. Tem um “Q” de Twin Peaks (série e filme de David Lynch), pois a cada take aparecia um personagem novo e bem estranho na vida do protagonista. Vale a menção da participação mais que especial do falecido ator Grande Otelo, que no pouco tempo que fica na história já dá o seu recado, contribuindo ainda mais para esta atmosfera Lynchiana já citada.
Já o segundo trabalho, O Príncipe Encantado, de 2009, feito em parceria com Fátima Toledo, narra de forma bem contemporânea e subversiva este mito. É absurdamente visível a diferença de qualidade dos projetos, não pela construção temática ou atuações, mas sim pelas ferramentas usadas nos dois curtas. O Príncipe Encantado pode ser considerado uma mega produção se comparada com Troca de Cabeça. Porém é interessante como de alguma forma há um diálogo entre eles, se parecem quando o assunto é construção dos personagens e atmosfera transpassada. Vale mencionar que O Príncipe Encantado traz no elenco a esposa e filho de Sérgio Machado, e que boa parte da produção do projeto veio da série Alice, que Sérgio dirigia na época (2009).
Depois da exibição dos filmes foi aberto o debate propriamente dito, na verdade foi mais uma conversa informal entre o cineasta e o jornalista e crítico de cinema João Carlos Sampaio, do Jornal A TARDE (BAHIA). João Sampaio não é só contemporâneo de Sérgio, como foi o assistente de direção no curta Troca de Cabeças. Por conta disso a conversa voltou-se para lembranças da época das filmagens, como o trabalho para captação de recursos, a venda de camisas e a curiosidade mórbida de que dois dos integrantes do filme já partiram dessa para outra melhor. Outro ponto a ser destacado diz respeito com a corajosa escolha de Sérgio Machado em trabalhar com cinema em um dos piores momentos da história da cinematografia brasileira. Lembremos que 1993 ainda era um período nebuloso, por conta da Era Collor, ainda em vigência na época. Só anos depois que o cinema brasileiro voltou a tomar gás, no período chamado de Retomada.
Resumindo:
Pontos positivos: sala cheia, o horário de início do evento respeitado, boa organização, ótimos convidados.
Pontos a serem melhorados: melhor dinâmica na apresentação do festival, público (parte pequena), que ainda teima em conversar durante toda a sessão (e que não é culpa da organização, vale menção), barulho irritante vindo do projetor da sala.
Cristiana de Oliveira é professora universitária, crítica cultural e editora do site