Os homens são de Marte… e é pra lá que eu vou!
Quando eu assisti o remake de Ti-ti-ti, telenovela das 19 horas, que foi exibida entre 2010 e 2011, algumas coisas me desagradaram. Eu sempre gostei da versão original, de Cassiano Gabus Mendes, exibida nos anos 80, não desmerecendo, aqui, o texto de Maria Adelaide Amaral – autora do remake – que, comumente, é uma escrita ótima. Mas, talvez, ter juntado duas novelas numa só – Ti-Ti-Ti era uma junção da versão original com outra novela de Cassiano, do final dos anos 1970: Plumas e Paetês – tenha sido algo que não me soou muito legal.
Entretanto, ao lembrar esse remake, imediatamente me vem à mente três pontos que eu considero bastante positivos tendo, por base, questões voltadas à teledramaturgia. São eles: passei a considerar Isis Valverde uma ótima atriz; percebi que Marcos Pigossi era um jovem ator sensacional, haja vista ter feito um maravilhoso personagem gay, em Caras & Bocas e, meses depois, um vilãozinho mimado em Ti-Ti-Ti que, em nada, lembrava seu personagem anterior e, por fim, confesso: torcia para que, a cada capítulo, houvesse várias cenas do núcleo de Dorinha, um tipo governanta da casa onde viviam as new faces, ou seja, as modelos novatas. Dorinha cuidava de absolutamente tudo que se relacionava às meninas, do andar à postura, à higiene e controle de alimentação.
Dorinha era magistralmente interpretada por Mônica Martelli.
Pouco tempo depois, no Rio, assisti Mônica no teatro, com o monólogo Os Homens São de Marte… E é pra lá que eu vou!. Sabia, de antemão, que eu estava com a minha noite ganha, indo assistir um espetáculo teatral não só protagonizado por Mônica, como escrito por ela! Como já era esperado por mim, a peça foi excelente e eu sai do teatro, naquela noite, torcendo para que Mônica não só quisesse levar sua peça para o cinema, como pudesse encontrar produtores interessados em levar, para as telas, aquela história da mulher quarentona que não consegue engatar, de forma alguma, um relacionamento, quem dirá, casar, seu maior sonho.
Provavelmente, tempos depois, Mônica não só quis como encontrou os tais produtores dispostos a levar para o cinema o seu texto teatral. E protagonizou uma das melhores comédias dessa primeira parte do ano de 2014. E, o melhor: soube acoplar, no seu roteiro (sim, o roteiro também é escrito por ela, em parceria com Patrícia Corso e Susana Garcia) comédia com romance. E há muito romance nesse filme!
Os Homens São de Marte… E É Pra Lá Que Eu Vou
Um muito bem vindo romance quando estamos num contexto cinematográfico nacional repleto de comédias tipo “mais ou menos”. Ou seja: aquelas comédias com roteiros fraquinhos, que beira o superficial, e que recorrem – para causar risos (?!) – àquelas piadas sem graça, muitas vezes escatológicas. Bem, de certa forma, essas comédias terminam por cumprir o seu papel.
Em OS Homens são de Marte…, Mônica interpreta Fernanda, uma mulher beirando os quarenta anos que já está sem namorado há algum tempo e, o pior, na visão dela, sem nenhuma previsão de ter um. Essa falta de perspectiva amorosa arrasa Fernanda, o que faz com que ela sempre procure um homem para, digamos, chamar de seu. Ao seu lado, seu sócio, interpretado por Paulo Gustavo, e uma constante amiga, otimamente interpretada por Daniele Valente.
Fernanda está desesperada. E isso fica evidente nas próprias falas e ações da personagem. E tal desespero em encontrar um homem, não só para transar (já que ela até que encontra caras bonitos e charmosos para sexo) mas – principalmente – para casar, provavelmente será alvo das críticas de pessoas cujo feminismo está enraizado nas veias, já que a premissa, presente em todos os 108 minutos do filme, é que a mulher precisa, sim, de um homem para ser feliz. O filme, até, já está sendo chamado de conservador…
E nessa busca por um alguém, Fernanda depara-se com um senador, charmosamente interpretado por Eduardo Moscovis, e com um empresário chegado a umas fantasias sexuais, como sexo grupal, personagem que coube a Humberto Martins.
(Aliás, diga-se de passagem, quanto mais maduros os dois vão ficando – Eduardo e Humberto – melhores atores estão se tornando, basta analisarmos seus últimos trabalhos na televisão).
Os Homens são de marte… e é pra lá que eu vou – Divulgação
Os Homens são de Marte… é repleto de clichês, assim como várias comédias românticas são, não só no Brasil, como em todo o mundo cinematográfico. Sempre foi assim e continuará! Alias, não entendo por que a crítica critica tanto os clichês. Eles existem aos montes no mundo ficcional. E não falo aqui só do mundo ficcional televisivo e/ou cinematográfico. Também literatura, teatro… Tem clichê o tempo todo, ora! O que importa é a maneira como tudo isso é conduzido. E, para se ter uma boa condução, partimos, sempre, do roteiro. O roteiro, inclusive, encabeçado por Mônica, é ótimo, faz a gente rir, sim (que mal há em rir, maioria dos críticos cinematográficos brasileiros?), mas também faz a gente refletir na situação daquela personagem, que não é feliz, por não ter alguém, e sofre, de verdade, por isso. Ela quer um homem e ela sofre por não ter. Ponto!
Ela até consegue um, digamos, marido, quando passa um período numa região litorânea da Bahia. Mas as diferenças entre os dois (ela, super urbana, ele, um alemão radicalizado, no Brasil, natureba, que ama uma vida de desapego, ao ponto de xixi e cocô serem feitos no rio que fica quase em frente à casa, já que ter um banheiro, segundo a filosofia de vida que ele segue, é sinônimo de apego!) com o passar do tempo, tornam-se gritantes e, ainda infeliz, ela retorna para São Paulo, o que significa voltar para a sua vida profissional (que, normalmente, não tem maiores problemas) e para o caos da sua vida sentimental.
Os Homens são de Marte… tem, enquanto produto audiovisual, uma característica maravilhosa: é um filme agradável de se ver. Daqueles que, ao terminar, a gente está com um sorriso nos lábios. Isso se deve, evidentemente, a direção de Marcus Baldini (diretor do também muito bom Bruna Surfistinha), ao roteiro, como também às atuações, não só de Mônica, mas também dos personagens secundários.
E o destaque, meu, vai para Paulo Gustavo. Ele faz Aníbal, o amigo gay de Fernanda. Os dois são sócios – numa empresa de festas de casamento – e Aníbal tem o mérito de ter as falas mais engraçadas do filme. E essas falas, ditas por Paulo Gustavo, ganham um mérito ainda maior. A existência deste personagem vem sendo criticada (dizem que o personagem é caricato) já que, no mundo em que certos críticos vivem, não existem gays exageradamente afeminados.
Os Homens são de marte… e é pra lá que eu vou – Divulgação
Li, em algum site, não lembro qual, numa entrevista de lançamento do filme, Paulo Gustavo dizer que ele se acha um péssimo ator, uma farsa. Eu, honestamente, não acho. Talvez, sim, ele sempre faça o mesmo tipo. Porém, ele diverte. Isso é fato. Ele cumpre o que promete, ele faz o que todo comediante tem a obrigação de fazer: divertir. Soube, também, por uma amiga, que ele, um dia, disparou essa: comédia não dá prêmio, mas dá dinheiro. Ele mentiu, ao afirmar isso?
É provável que Os Homens são de Marte… faça uma ótima bilheteria. E, se fizer esse sucesso esperado, fará merecidamente, por uma razão muito simples: todo mundo quer encontrar alguém. E o filme, basicamente, fala sobre esse encontrar uma pessoa e ser feliz com ela, mesmo que, como diz a (ótima) música de Lulu Santos, a qual toca no filme, “se amanhã não for nada disso, caberá, só a mim, esquecer…”.
O fato é que muitos já passaram pelas mesmas situações que Fernanda passou ou, pelo menos, conhece alguém que já passou ou que esteja na mesma situação. Eu, por exemplo, já passei. E as/os feministas que me desculpem, mas pode até ser bom viver sozinho por um tempo… Mas, só por um tempinho…
Como disse, o filme está sendo chamado, por alguns críticos, de conservador, machista, e tals… Bem, talvez eu também seja conservador, machista e tals, pois, para mim, sinceramente, o bom mesmo é a gente ter um homem para chamar de seu!
Mauricio Amorim é Professor de Linguística e Produção Textual da Universidade do Estado da Bahia, Especialista em Linguagens e Mídias Audiovisuais, Cineasta e Colunista do Cabine Cultural.