Sim, todas as produções que concorrem à estatueta de Melhor Filme, no Oscar 2014 são, de fato, obras excelentes. Raramente foram vistos tantos filmes de qualidade – tanto técnica quanto artística – concorrendo juntos: são nove filmes que concorrem à estatueta principal, sem contar as várias outras ótimas produções que ficaram de fora, a exemplo de All Is Lost (título em português: Até o Fim) e, evidentemente, Inside Llewyn Davis, o novo e ótimo filme dos Irmãos Coen.
A cerimônia do Oscar, uma grande festa que muitos consideram chata (eu, particularmente, adoro), acontece no próximo domingo, dia 2 de março. E, antes mesmo de chegar a esta data, várias outras premiações do cinema já aconteceram, a exemplo do Globo de Ouro, do BAFTA (considerado o Oscar Britânico), o SAG Awards e, na véspera do Oscar, acontecerá o Independent Spirit Awards.
Pelas premiações que já ocorreram, pode-se ter uma ideia do que, muito provavelmente, acontecerá no Oscar. Apesar – insisto no que defendi no texto passado – do Oscar ser, muitas vezes, uma surpresa: um favorito, inclusive ganhador dos prêmios que antecedem o Oscar, pode sair de mãos vazias, sem estatueta dourada alguma.
O fato é que a temporada de 2013 foi uma das melhores já vistas: filmes muito bem produzidos, histórias muito bem contadas, atuações impecáveis (que ano cheio de atuações masculinas e femininas maravilhosas!), roteiros perfeitos… Um excelente ano para o cinema.
Sendo assim, após essa breve introdução sobre o quanto o ano passado nos presenteou com grandes filmes, passo, agora, a discorrer sobre alguns dos títulos que podem, ou não, sair vitoriosos no domingo que vêm.
A começar pelo excelente e que, provavelmente, não sairá com Oscar algum: Capitão Phillips.
Capitão Phillips, um filme muito bem dirigido pelo Paul Greengrass, ficará na história por dois motivos.
Motivo um: tem, em Barkhad Abdi, uma das melhores atuações do ano, a qual concorre na categoria Ator Coadjuvante. Abdi faz o líder dos piratas que sequestram o navio do Capitão Phillips, em águas na região da Somália. Contudo, apesar de ter ganhado o BAFTA, não ganhará o Oscar, já que todas as apostas estão concentradas na atuação magistral (e, para mim, inesperada) de Jared Leto que, apesar de lindo, sempre o considerei um ator mediano. Leto concorre a coadjuvante por Clube de Compras Dallas e tem 99,99% de chance de levar o Oscar. O ideal, e justo, nessa categoria, seria um empate: Abdi e Leto estão perfeitos.
Motivo dois: inacreditável, mas Tom Hanks não está entre os cinco candidatos a Melhor Ator Principal deste ano! Se existia uma indicação certeira nesta categoria, era a indicação de Hanks. E teria sido uma indicação justa, pois, além do fato inquestionável de que Tom Hanks é um dos melhores atores da atualidade, é fato também que seu Capitão Phillips é perfeito. Coragem, determinação, medo e uma crescente aflição, são marcas constantes na atuação de Hanks, nessa obra. Mas, enfim, não foi indicado…
O que não significa que os outros concorrentes sejam fracos. Não são, não! Talvez, Melhor Ator, venha a ser uma das categorias mais difíceis deste ano.
É óbvio que Matthew McConaughey deve ganhar o Oscar de Melhor Ator, já que sua atuação em Clube de Compras Dallas é sensacional, perfeita, a qual difere de quase tudo que esse ator (até então bastante conhecido, no Brasil, pelas comédias românticas) já fez. Porém, se um Bruce Dern, por Nebraska, ou um Christian Bale, por Trapaça, ganhar, será uma injustiça? Não, não! Ambos estão perfeitos nos seus filmes.
Contudo, uma observação à parte vai para os dois outros atores que concorrem nesta categoria: Leonardo DiCaprio e Chiwetel Ejiofor.
Dizem que a Academia não gosta de DiCaprio, já que o ator raramente é indicado ao Oscar e, quando indicado, nunca ganha. É preciso lembrar que essa Academia que parece não gostar de DiCaprio o indicou, pela primeira vez, em 1993, por Gilbert Grape, quando Leo DiCarpio estava, ainda, no início de sua adolescência. De fato, ele não ganhou como coadjuvante por Gilbert Grape nem nas outras indicações recebidas no decorrer das décadas seguintes. E, pelo que tudo indica, também não ganhará esse ano a estatueta por O Lobo de Wall Street, mais uma parceria sua com o diretor Martin Scorsese. Não pela sua atuação, a qual está sensacional, e sim devido ao forte favoritismo de McConaughey.
Já Chiwetel Ejiofor concorre ao Oscar pela primeira vez. E merece ganhar. É o meu favorito. Humanidade, aflição, medo, angústia e esperança são só alguns dos sentimentos que esse belo ator britânico passa, através, muitas vezes, do seu olhar, interpretando o escravo alforriado Solomon Northup que é sequestrado no de 1841 e forçado a trabalhar na plantação de fazenda de um cruel proprietário de escravos, interpretado pelo também indicado – a ator coadjuvante – Michael Fassbender. O trabalho de Chiwetel é excepcional: a cena final, então, exatamente a última cena do filme antes do fade, mostra o quanto esse ator ainda nos brindará com grandes e emocionantes atuações.
As atrizes também brilharam nesse ano que passou, daí a presença de cinco fortíssimas candidatas ao Oscar de Melhor Atriz. Entretanto, de todas as atuações femininas e, como disse, fortes atuações, a de Cate Blachett, no ótimo Blue Jasmine, do sempre, no mínimo, perfeito Woody Allen, é a atuação que, assim como a de McConaughey, tem quase cem por cento de chance de sair vitoriosa. Porém, como não se render a Sandra Bullock que, praticamente, está só no filme Gravidade? Gravidade já está entre os grandes filmes feitos nos últimos tempos, ganhando ou não ganhando estatuetas douradas. Contudo, a atuação de Sandra dá, a essa obra do também indicado diretor Alfonso Cuarón, uma grandiosidade ainda maior. Chego até a afirmar que, nesse ano, sim, Bullock deveria ganhar o Oscar, e não há alguns anos atrás, quando levou a estatueta pela sua atuação, apenas perfeita, em The Blind Side (em português, Um Sonho Possível).
Mesmo que o favoritismo esteja com Cate Blanchett, não podemos esquecer que, nesta categoria, há Meryl Streep, perfeita, e nada over, exagerada, e coisas do tipo – como muitos disseram – em Álbum de Família. E a bela atuação de Judi Dench, em Philomena? E Amy Adams, com um personagem bem diferente do que costuma interpretar, em Trapaça? Como disse: ótimas atuações femininas.
Entretanto, na categoria Melhor Atriz Coadjuvante, parece não haver surpresa. Ou ganha Jennifer Lawrence, por Trapaça, ou Lupita Nyong’o, por 12 Anos de Escravidão. Eu gosto muito dos trabalhos de Jennifer, mas… Como não torcer por essa atriz de origem queniana que simplesmente arrasa, em todas as cenas em que aparece, em 12 Anos de Escravidão? Entretanto, será uma injustiça, um prêmio não merecido, se Julia Roberts ganhar pela sua perfeitíssima atuação em Álbum de Família? Ou ainda Sally Hawkins, por Blue Jasmine ou a veterana June Squibb, por Nebraska? É como eu disse e repito: um ano de excelentes atuações no cinema.
Quanto ao Oscar de Melhor Diretor, por mais que eu torça para 12 Anos de Escravidão levar a estatueta de Melhor Filme, e por mais que eu também considere um maravilho trabalho de direção, por parte de Steve McQueen, o Oscar, nesta categoria, tem que ir para Alfonso Cuarón. Seu trabalho de diretor em Gravidade é um misto de talento, competência e alto entendimento da linguagem cinematográfica. Só aquele plano sequência de 17, 18 minutos, logo no início do filme… Perfeito!
Na categoria Roteiro (tanto original quanto adaptado) há também bons títulos concorrendo.
Woody Allen, mais uma vez, concorrendo como roteirista – seu último Oscar foi pelo roteiro original de Meia Noite em Paris. Concorrendo com ele, há os roteiros de Ela, de Spike Jonze – meu favorito nesta categoria – e os de Trapaça, Nebraska e Clube de Compras Dallas. Se for para Ela, será um prêmio bastante merecido.
Já na categoria Roteiro Adaptado, todos, absolutamente todos os roteiros são perfeitos. Por mais que eu torça, novamente, por 12 Anos de Escravidão, como não torcer também pelo perfeito texto de O Lobo de Wall Street? Ou a sensibilidade nas palavras do roteiro de Philomena? Contudo, há um concorrente, nesta categoria, que não foi baseado em livros, contos, peças de teatro, relatos jornalísticos ou algo parecido: foi baseado em personagens que já estiveram em outros filmes. Falo do texto de Antes da Meia-Noite, cujos personagens já estiveram em Antes do Amanhecer e, depois, em Antes do Pôr do Sol, ambos, assim como Antes da Meia Noite, estrelados pela dupla Ethan Hawke e Julie Delpy, os quais também escreveram o roteiro deste último, junto a Richard Linklater.
Há fortes concorrentes entre os indicados aos chamados prêmios técnicos. Termo, aliás, no mínimo, inadequado, já que edição (montagem), direção de arte, trilha (música), fotografia, e afins, colaboram extremamente para que o cinema venha a ser uma ARTE.
No que se refere a essas outras categorias, creio que Gravidade deve (e merece) levar a maioria. Tranquilamente, daria a esse filme do Cuarón o Oscar de Efeitos Visuais. Não há Hobbit ou Star Trek nenhum que mereça mais esse Oscar do que Gravidade. O mesmo afirmo com relação à edição de som, mixagem de som e montagem: prêmios que devem ir para Gravidade.
Direção de Arte (também chamada de Desenho de Produção) talvez caia nas mãos do exagerado (como tudo de Baz Luhrmann) O Grande Gatsby, ou até para o futuro representado em Ela. Porém, meu favorito, nesta categoria, é a recriação dos anos 1970, em Trapaça. Achei perfeito!
E, Fotografia, quem sabe Nebraska – com sua fotografia preto e branco – não leve, merecidamente, o Oscar?
A grande questão é que, por mais que eu e milhões de pessoas que escrevem sobre cinema, aqui no Brasil ou no mundo, falem e comentem sobre palpites do Oscar, só saberemos os vencedores na hora em que cada um daquele envelope for aberto e o apresentador diga “… and the Oscar goes to…” pois, na mesma proporção que sempre houve favoritismo no Oscar, sempre houve, também, surpresas e, principalmente, injustiças… Isso é o Oscar. Um prêmio puramente comercial? Sim, talvez. Mas um prêmio que todos nós, que amamos cinema, assistimos todos os anos, torcendo, vibrando (quando nossos favoritos ganham) ou lamentando (quando nossos favoritos perdem), porém, adorando ficar ali na frente da TV, durante mais de três horas de cerimônia, ou de festa, como prefiram chamar.
Bom Oscar 2014 para todos nós!
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Mauricio Amorim é professor de Linguistica e Produção Textual da Universidade do Estado da Bahia, Cineasta e Colunista do Cabine Cultural.