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Sete Vidas: uma novela quase sem clichês, que deixará saudade entre os telespectadores

Sete Vidas

“Sete Vidas foi uma obra de arte! E torço para que muitas outras telenovelas, globais ou não globais, possam alcançar tal patamar de excelência!”

Por Mauricio Amorim

Se analisarmos as novelas das 18h, da Rede Globo de Televisão, dos últimos cinco anos, chegaremos, facilmente, à conclusão de que, praticamente, todas elas tiveram não só uma esmerada produção – esmero este semelhante às produções do principal horário de telenovelas da Globo: o das 21h – como foram dignas dos melhores elogios feitos por aqueles que gostam e acompanham as telenovelas brasileiras.

Eu sou um destes que, desde a já longínqua década de 70, acompanho novelas. E afirmo, categoricamente, que as tramas das 18h têm sido as mais bem escritas, as mais bem produzidas e as mais bem compreendidas e aceitas pelo público brasileiro.

Para exemplificar esses meus dois parágrafos iniciais, basta lembrarmos das maravilhosas Cordel Encantado e Jóia Rara, ambas de Thelma Guedes e Duca Rachid, Amor Eterno Amor, de Elizabeth Jhin, Araguaia Flor do Caribe, ambas de Walter Negrão, a premiada internacionalmente Lado a Lado, de João Ximenes Braga e Claudia Lage, Meu Pedacinho de Chão, de Benedito Ruy Barbosa, e A Vida da Gente, de Lícia Manzo, a mesma autora da recém finalizada Sete Vidas.

Sete Vidas foi uma novela curta – apenas quatro meses – para os padrões globais. E, exatamente por ter sido curta, livrou-se de um grande problema que todo autor de novela enfrenta, na grande maioria das vezes: lidar com a “barriga”, ou seja, aquele momento na trama em que a história parece se arrastar, em que nada parece estar acontecendo.

Em Sete Vidas, isso não aconteceu. E não aconteceu tão somente por causa do pouco tempo em que esta novela ficou no ar. E, sim, por causa da qualidade do texto de Lícia Manzo. Em A Vida da Gente – sua ótima novela de estréia como autora titular, em 2001 -, assim como no pouco visto seriado Tudo Novo de Novo, ela já havia mostrado que sabia escrever sobre o cotidiano das pessoas. Já havia mostrado que falar sobre as nossas fraquezas, nossos conflitos mais íntimos, os quais, algumas vezes, terminam por serem externados, e a capacidade que todos nós temos de nos transformar, seriam, esses, seus pontos principais – senão os únicos – de discussão numa obra, mesmo que a obra fosse uma obra aberta, que precisaria agradar o público, para que a audiência fosse alta, como é o caso das telenovelas.

E muito de conflitos íntimos foi discutido em Sete Vidas. A verdade é que a novela toda, do seu início ao seu final, foi uma discussão de relação que durou quatro meses. E que o público adorou! Adorou exatamente porque esse mesmo público se viu retratado nas várias tramas daquela novela. Muito provavelmente, em muitos momentos, nós víamos, ali, um parente, um vizinho, um amigo e/ou inimigo e, mais provavelmente ainda, em alguns (ou vários) momentos, nos víamos ali. Por mais efeito especial, por mais astros e estrelas presentes na trama, por mais ação – no sentido de movimento – e explosões e tal, que uma produção venha a ter… Ela não terá garantia de sucesso. Porém, se tiver a nossa vida ali retratada, o nosso cotidiano bem escrito e bem representado, é uma garantia de que o sucesso de audiência poderá existir.

Sete Vidas

Outro ponto favorável para o sucesso de Sete Vidas foi o fato de a autora e Rede Globo terem apostado numa trama que não só mostrou, como valorizou, os novos conceitos de família. O protagonista Miguel, em busca de dinheiro, nos Estados Unidos, doou seu sêmen para um banco de esperma. Décadas depois, desse sêmen, nasceram seis filhos, os quais, gradativamente, vão se conhecendo no decorrer da trama da novela.

Todo o elenco brilhou nesta trama. Seria infinitamente injusto destacar uns e não outros. Dos mais novos na televisão, como o ator Guilherme Lobo, do espetacular longa Hoje Eu Quero Voltar Sozinho, aos que já estão estabelecendo uma carreira proveitosa como atores, a exemplo de Isabelle Drummond e Jayme Matarazzo, aos experientes, como Regina Duarte, Cyria Coentro, Débora Bloch, Ângelo Antonio, a novela teve um bem vindo equilíbrio de atuações. Outro ponto favorável à produção!

A abertura, ao som de What a Wonderful World, na voz de Tiago Iorc, foi uma das mais belas aberturas vistas por mim, nos últimos anos, na Rede Globo. A versão dele – muito bonita – e as imagens cotidianas sendo mostradas, na abertura… Perfeito!

O último capítulo, então, é digno de nota.

Não houve casamentos, a mocinha não foi seqüestrada e salva pelo seu grande amor, não houve a revelação de um grande segredo, o vilão ou vilã não foi preso ou morto… Aliás, nem vilão, nem vilã houve! O último capítulo de Sete Vidas, assim como todos os outros 105 capítulos anteriores, primou pela simplicidade, pela competência textual e interpretativa.

Sempre defendi – e continuarei defendendo – que telenovela é arte! Nos meus escritos, nas minhas aulas para o curso de TV, entre amigos e conhecidos, afirmo e defendo: telenovela é arte! E são exemplos como esses – quando vemos um belo texto recebendo vida na voz dos seus interpretes, quando percebemos que temas necessários de discussão são trazidos à tona, quando ouvimos uma bela trilha sonora acompanhando cenas tão belas quanto à trilha, quando nos emocionamos vendo aquela trama sendo conduzida com tamanha verdade, com tamanha sinceridade… – que fazem com que eu continue na minha defesa de que novela é arte.

Sete Vidas foi uma obra de arte! E torço para que muitas outras telenovelas, globais ou não globais, possam alcançar tal patamar de excelência!

Mauricio Amorim é Professor de Produção e Direção para TV e Vídeo, Edição, Roteiro, Linguística e Produção Textual da Universidade do Estado da Bahia, Especialista em Linguagens e Mídias Audiovisuais, Cineasta e Colunista do Cabine Cultural.

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